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O Senhor dos Anéis

Guarulhos, 28 de dezembro de 2001

ImagemFico com a sensação de estar cometendo uma heresia. Mas eu não li “O Senhor dos Anéis”… Vinte anos atrás, quando passou a adaptação em desenho animado do livro, fiquei tentado mas consegui resistir. Depois não consegui embarcar na onda e expectativa que cercou a versão para o cinema feita por Peter Jackson, que com certeza foi o filme mais esperado de 2001. Pelo menos há três anos que na Internet não se fala noutra coisa, no fato de que ele rodou os 3 filmes ao mesmo tempo (um fato inédito e arriscado, porque se o primeiro fracassasse os outros não teriam razão de ser e o prejuízo seria certo), na dificuldade de adaptar um livro cult, na escalação do elenco, na pré-estréia da fita em Cannes (apenas vinte e poucos minutos para provar que era bem realizada para os distribuidores internacionais). Enfim, quem vai ao cinema regularmente sabe da existência de “O Senhor dos Anéis” e de sua estreia mundial simultânea (menos no Brasil, onde ficou para 2002).

Mas acho que fiz a coisa certa em não ler o livro para não acontecer como em “Harry Potter e a Pedra Filosofal”, em que saí resmungando que o livro era melhor. Claro, porque os livros sempre são melhores. Melhor dizendo, são outra coisa e é muito difícil você se desligar do que imaginou, dos detalhes que ficaram de fora, dos momentos prediletos que foram sintetizados ou dramatizados. Ou seja, nunca se pode ser fiel e isso pode decepcionar. Felizmente, então, eu gostei de “O Senhor dos Anéis: a Sociedade do Anel”. E muito.

São mais de três horas e em nenhum momento fiquei cansado como em “Harry Potter”, nem fiquei olhando no relógio (tive sim que dar uma fugida rápida ao banheiro, coisas de quem faz dieta regularmente). Conhecia a historia em suas linhas gerais, mas nem por isso deixei de ficar emocionado e interessado. O fato de Peter Jackson ser neozelandês e pouco conhecido só contribuiu para o filme. Em parte porque pôde rodar em sua terra, que tem paisagens superadequadas e variadas (dá vontade de marcar uma viagem para lá com urgência), em parte porque ele sabe criar suspense, clima, usar efeitos especiais (a maior parte dos filmes anteriores dele são de terror, como “Os Espíritos”, com Michael J. Fox). Mas ainda assim é um trabalho supercompetente, melhor do que faz George Lucas ou Chris Columbus (talvez ainda não Steven Spielberg, mas perto de Ridley Scott).

Começando pela escalação do elenco. O fato de o filme ter sido feito por um estúdio menor, a New Line, deve ter dado a Jackson mais liberdade de ação. Não chamou astros superfamosos para não influenciar no orçamento final (que deve estar por volta de US$ 270 milhões para os três filmes), mas acertou inteiramente nas escolhas. O ex-ator infantil Elijah Wood faz o protagonista Frodo, no que é certamente o papel de sua vida. Ele ficou pequenino em seu personagem Frodo, que é um Hobbit – ou seja, quase um anão -, e Elijah não cresceu muito. O filme também faz um uso extensivo e por vezes até excessivo de seus belos olhos azuis. O seu fiel escudeiro Sam é Sean Astin (que para o papel engordou um pouco), filho da estrela Patty Duke e do ator John Astin.

Os feiticeiros centrais são feitos por duas ilustres figuras: Sir Ian McKellen, de “Deuses e Monstros”, um ator maravilhoso no papel de Gandalf, o Cinzento; e o lendário Christopher Lee como Saruman, o Branco (como alguém pode não ter uma lembrança afetuosa da ilustre figura do antigo Drácula?). Os cavaleiros amigos são Sean Bean (Boromir) – o ator irlandês tem o melhor momento de sua carreira, num personagem conflitado, que consegue transformar em humano e sincero na luta entre o bem e o mal, sentimentos provocados pelo Anel – e Viggo Mortensen (Aragorn). A ótima Cate Blanchett é a narradora da história, a Senhora Galadriel, imortal Élfica, e uma outra, Liv Tyler (Arwen), é um personagem que mal aparecia no primeiro livro e serve de interesse romântico (ela que é muito fraquinha até que se sai bem; aliás, todos esses personagens retornarão). Ian Holm (Bilbo) aparece na parte inicial e está tão perfeito que merecia uma indicação ao Oscar®.

Confesso que fiquei um pouco confuso com a narração do princípio, que resume os fatos, mas felizmente tudo que é contado depois fica melhor explicado durante a fita (pelo jeito só colocaram isso porque os filmes seguintes terão que começar com um resumo da fita anterior e assim fica com mais unidade). Não sei se ainda é preciso fazer um resumo da história, pois basta dizer que é uma Saga passada na Terra-Média, em tempos anteriores à chegada do Homem, quando vários povos se unem para tentar se livrar de um anel que foi conjurado por uma Entidade do Mal. Frodo é o Hobbit escolhido para essa missão que levará três filmes (os seguintes chegarão um por ano, no final de 2002 e 2003).

Os efeitos especiais não são particularmente novos, mas sempre competentes (o filme tem figuras fortes demais para crianças pequenas, sendo mais indicado para maiores de dez, doze anos), com um imaginário gótico. Felizmente a direção alterna planos próximos (que dá maior chance aos atores) com outros mais indicados para os efeitos e cenas de ação. A única coisa que me incomodou um pouco foi a substituição dos Hobbits por anõezinhos nos planos gerais, para deixar bem claro que eles são menores que os outros personagens, inclusive os Humanos.

Isso já está perfeitamente visível antes e não era preciso ser enfatizado mais. Ou seja, para quem gosta desse tipo de aventura-fantasia é um dos mais bem-sucedidos e não concordo que a história tenha perdido seu impacto devido às imitações (o original já tem perto de 50 anos, e “Star Wars” e filhotes são derivados dele, aliás de forma assumida). Não estou muito apto a discutir a adaptação, mas pelo que andei pesquisando (por exemplo, a resolução com Boromir é no começo do segundo livro e foi incluída neste primeiro filme) as poucas mudanças foram felizes e adequadas. E o mais importante: dá realmente vontade de ler o livro e saber a resolução da trama em vez de ficar esperando mais um ano ou dois anos pelos próximos capítulos.

Confira algumas cenas do filme