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Empresa dos EUA clona embrião humano

Guarulhos, 26 de novembro de 2001

DivulgaçãoSob protestos do Congresso dos Estados Unidos e surpresa da opinião pública, a companhia americana ACT (Advanced Cell Technology) anunciou ontem ter concluído a primeira clonagem de um embrião humano da história.

Repetindo a mesma base do processo utilizado para clonar a ovelha Dolly, em 1996, cientistas da ACT, trabalhando secretamente num laboratório no Estado de Massachusetts durante um ano, substituíram com sucesso o DNA (molécula onde está codificada a receita para construir um indivíduo) de um óvulo humano pelo DNA do núcleo de uma célula adulta de pele humana.

Células-tronco

Os diretores da ACT disseram que o objetivo da experiência não é criar um ser humano clonado, mas usar o embrião clonado para fins terapêuticos, na obtenção de células-tronco para o tratamento de diversas doenças.

Células-tronco podem transformar-se em qualquer outro tipo de célula no corpo humano. Por essa razão, os embriões clonados podem, em tese, fornecer material para regenerar tecidos com problemas em órgãos como o fígado, o pâncreas ou a medula óssea, sem problemas de rejeição -afinal, eles têm exatamente a mesma sequência de DNA do paciente.

Uma das grandes promessas do uso terapêutico dessas células é substituir células defeituosas em diabéticos, curando a doença. Ou regenerar a medula óssea de indivíduos portadores de leucemia.

“Cientificamente, biologicamente, as entidades que estamos criando não são indivíduos. Elas são apenas vida celular, não são vida humana”, disse Michael West, presidente e executivo-chefe da companhia. “O que esperamos é entrar numa nova era, que chamamos de medicina regenerativa, onde podemos usar tecnologias de clonagem não para copiar seres humanos, mas para trazer as células ao estágio embrionário e, pela primeira vez, substituir células doentes”, afirmou.

Apesar das garantias da companhia, seus cientistas deram exatamente os primeiros passos usados para clonar um ser humano. Por essa razão, o anúncio provocou protestos imediatos no Congresso norte-americano. A Casa Branca informou que o presidente George W. Bush não falaria a respeito, mas que condena qualquer tipo de experimento de clonagem.

Os americanos não esperavam que a iniciativa fosse partir de dentro do país. As expectativas, até agora, se concentravam no italiano Severino Antinori e no cipriota radicado nos EUA Panos Zavos, que anunciaram para o ano que vem a produção do primeiro clone humano – com finalidade reprodutiva-, em algum país do Mediterrâneo.

A legislação americana proíbe apenas o uso de dinheiro dos contribuintes na clonagem de seres humanos. Em julho, a Câmara dos Representantes aprovou um projeto que barraria experiências do tipo (leia texto à esq.).

“Francamente, o anúncio é desconcertante”, declarou o líder da maioria democrata no Senado, Tom Daschle. “Isso está indo na direção errada.”

Antevendo protestos, a companhia adotou desde o início dos experimentos, há um ano, uma estratégia para salientar seus objetivos terapêuticos.

A célula de pele humana usada no experimento pertence ao cientista Judson Somerville, de 40 anos, que ficou paralítico depois de um acidente de bicicleta. Segundo a empresa, a paralisia pode em tese ser curada com tratamentos médicos derivados da clonagem de embriões humanos.

Além da estratégica escolha de uma célula de Somerville, uma repórter da revista “U.S. News & World Report” foi autorizada a acompanhar toda a experiência, que durou mais de um ano, e a publicar sua reportagem ontem, simultaneamente ao anúncio feito pela companhia.

Mas a controvérsia está implícita nas entrelinhas das próprias declarações de representantes da empresa. “Nossos resultados preliminares somam-se a outras evidências de que a reprogramação de uma célula humana é possível”, disse ontem José Cibelli, um cientista argentino que ocupa o cargo de vice-presidente de pesquisas da ACT. “São resultados ainda preliminares, mas, dada a importância de seu uso no campo da medicina regenerativa, decidimos publicá-los agora”, afirmou.

A equipe da ACT, liderada por Cibelli e pelo americano Robert Lanza, publicou uma descrição do experimento na revista científica “The Journal of Regenerative Medicine” (www.liebertpub.com/ebi/default1.asp). Um artigo escrito pelos cientistas sobre o experimento também foi publicado na página da revista “Scientific American” na internet (www.scientificamerican.com).