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Reformas aumentam custo tributário

Guarulhos, 15 de agosto de 2003

Se as propostas das reformas tributária e da Previdência forem mantidas como estão, as empresas podem se preparar para arcar com um aumento dos custos tributários, estima o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT). A pedido do Portal Exame, a equipe técnica do IBPT projetou qual seria o impacto das reformas sobre alguns setores e concluiu que o aumento tende a ser expressivo a ponto de inibir a capacidade das empresas de investir. “O Brasil precisava de uma reforma corajosa que reduzisse a carga tributária, mas as propostas que estão aí mostram que o governo não acredita no crescimento do país e tem medo de perder arrecadação”, diz Gilberto Luiz do Amaral, presidente da instituição. “Com as reformas pode haver um alívio para as exportações, mas setores que atuam no mercado interno terão aumento.”

Empresas do setor automotivo, por exemplo, que enfrentam uma das maiores crises da história, teriam um aumento de carga tributária da ordem de 3,3% sobre o faturamento. O percentual representaria a arrecadação extra de 2,6 bilhões de reais, levando-se em conta que o setor faturou no ano passado por volta de 90 bilhões de reais, segundo dados do guia Melhores & Maiores, da revista Exame.

Para as empresas de telecomunicações, a alta seria similar, da ordem de 3,2%. As indústrias de embalagens plásticas, que abastecem outros setores, podem ter um crescimento da ordem de 1,8% na carga tributária. Até as empresas de varejo tendem a ter uma alta, apesar de menor, da ordem de 0,6%.

Aumentos de impostos costumam terminar no bolso dos consumidores. Mas na atual conjuntura econômica, com queda nas vendas e na renda, Amaral acredita que as empresas serão obrigadas a absorver os aumentos reduzindo os investimentos – uma vez que já cortaram as margens de ganhos em anos anteriores. “As empresas não têm mais capacidade de assimilar novos custos tributários, nem os consumidores podem suportar aumentos de preços”, diz ele. “Dentro do contexto atual, as reformas tendem a inibir a retomada do crescimento, incentivar a sonegação e a informalidade.” Indicativo dessa tendência está no aumento da inadimplência tributária, que cresceu 37% no primeiro semestre deste ano em relação a igual período do ano passado.

Segundo IBPT, as principais alterações tributárias que podem ocorrer para as empresas dizem respeito três mudanças:

Unificação de alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A exposição de motivos da reforma tributária estabelece que os estados não terão perda de arrecadação com a unificação da legislação. O ganho médio da arrecadação dos estados seria de 10% em relação a 2002, o que leva os tributaristas a projetarem aumento do ICMS. Segundo divulgou a Agência Brasil na terça-feira (13/8), o texto da reforma fixou cinco alíquotas, de 4%, 12%, 15%, 18% e 25%, para o período de implantação do novo sistema, até que o Senado Federal aprove novos índices. Estados que já praticam alíquota acima de 25% poderão manter uma banda de até cinco pontos percentuais acima desse percentual em três anos para até três produtos. E terão, ainda, outros três anos para adotar uma queda programada e chegar ao teto, ou seja, 25%.

Mudança do regime da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) para não-cumulativa (nos mesmos moldes do PIS, a Contribuição para o Programa de Integração Social). Ao tirar o efeito cascata da PIS, o governo elevou a alíquota de 0,65% para 1,65%. Os tributaristas consideraram a alíquota elevada, tanto que a mudança rendeu um aumento de 6 bilhões de reais na arrecadação. A tendência é que o mesmo ocorra quando a Cofins deixar de ser uma contribuição em cascata.

Modificação do cálculo da contribuição patronal para o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Hoje, o INSS patronal incidente integralmente sobre a folha de pagamento. Na proposta da reforma, metade da contribuição continuaria a incidir sobre a folha, mas a outra parte recairia sobre o faturamento. As empresas que dependem do uso intensivo da mão-de-obra e têm alto custo para manter a folha de pagamento tendem a ser beneficiadas com um alívio tributário. Mas para a maioria, a mudança vai significar mais um aumento.

Tributo de primeiro mundo

Estimativas do IBPT sinalizam que, apenas no primeiro ano de vigência, as reformas tributária e da Previdência podem gerar um acréscimo de 45,44 bilhões de reais à arrecadação pública e elevar a carga tributária do Brasil dos atuais 36,45% para 39,89% do Produto Interno Bruto (PIB) – um percentual aplicado apenas em países de primeiro mundo.

Na França, por exemplo, a carga tributária equivale a 45,4% do PIB, na Itália, a 41,8%. Governos de países emergentes têm sido cautelosos na hora de onerar o caixa das empresas e o bolso do contribuinte. No Chile, a carga tributária representa 17,3% do PIB, no México, 18,3%.

CPMF

A maior parcela do ganho com a reforma tributária tende a ser sustentada por um tipo de tributo incomum na maioria dos países: a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). O extra deve chegar a 23 bilhões, o equivalente a 1,74% do PIB, pelos cálculos do IBPT. O bolo é de tal tamanho que alimenta a disputa entre União, estados e municípios, interessados na partilha dos recursos. O relatório final da reforma tributária será entregue à comissão especial que analisa a proposta na próxima segunda-feira (18/8), maso relator do projeto, o deputado federal Virgílio Guimarães (PT-MG), deixou claro que não haverá repasse dos recursos para os estados e municípios. “A partilha da CPMF já está sendo feita por meio das transferências para o Sistema Único de Saúde (SUS)”, justificou Virgílio à Agência Brasil.

Desde a sua implantação, em 1997, a CPMF já rendeu cerca de 75 bilhões de reais aos cofres públicos. Só no ano passado foram 20,37 bilhões de reais. Para os tributaristas, dificilmente o governo abriria mão de tributo tão eficiente. Para este ano, estima-se a coleta de 23 bilhões de reais. Uma emenda constitucional prevê a redução da alíquota da CPMF de 0,38% para 0,08% no ano que vem. A mudança reduziria a arrecadação total para 4,8 bilhões de reais. Mas se mantida a alíquota, a arrecadação total subirá para 27,8 bilhões.

Mas para contornar as perdas com a redução da CPMF, o governo passou a elevar a arrecadação com outros tributos. Já aumentou a contribuição sobre os combustíveis, a Cide (2 bilhões de reais), e a PIS (que rendeu 6 bilhões de reais). Também manteve a tabela do imposto de renda congelado (4 bilhões de reais). Em setembro, entra em vigor o aumento da Cofins para as instituições financeiras (1,2 bilhão de reais) e também a alta da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para os prestadores de serviços (1,4 bilhão de reais). Como a reforma tributária está em curso, novos aumentos ainda podem ser feitos. Um exemplo: Guido Mantega, ministro do Planejamento, nos últimos dias vem cogitando publicamente outro aumento da Cide para financiar obras de infra-estrutura.

Governo

O governo garante que há tempo para votar a reforma tributária ainda neste ano, afirmou nesta quinta-feira (14/8) o ministro José Dirceu (Casa Civil), durante visita ao Congresso. Dirceu afirmou que o Senado cumprirá a sua etapa de votação até 30 de setembro. Segundo o ministro, os líderes dos partidos da base aliada lhe asseguraram que vão se empenhar nesse sentido.

Para Dirceu, a reforma tributária deve dar ao mercado uma sinalização clara de que o governo não vai aumentar a carga de impostos. O ministro afirmou que a reforma precisa ser neutra e que o pacto federativo não será rediscutido. Dirceu defendeu que a reforma deve desonerar as exportações, assegurar o equilíbrio fiscal e simplificar o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). As declarações de Dirceu foram feitas à Agência Brasil.

Alexa Salomão