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Especulação faz risco-Brasil quebrar mais um recorde

Guarulhos, 24 de maio de 2002

O risco-Brasil ultrapassou ontem a barreira dos mil pontos diante da especulação em torno da sucessão presidencial, da fuga dos grandes investidores estrangeiros e de uma aposta errada dos bancos no dólar estável. No fim do dia, a taxa, medida pelo banco americano JP Morgan, recuou para 972 pontos – mesmo assim, uma alta de quase 3% em relação à véspera e o nível mais alto do ano. O risco brasileiro só perde hoje para os de Argentina, Equador e Nigéria e é maior do que o de países como Venezuela, e Rússia.

“Nos últimos dias, houve um aumento generalizado do risco dos países emergentes devido a uma corrida dos investidores estrangeiros para ativos mais seguros, como os títulos do Tesouro americano. Existe um temor muito grande em relação a atentados terroristas nos Estados Unidos e isso influencia todo o mercado”, explicou Dany Rappaport, da consultoria Tendências.

Entre os emergentes, o mais prejudicado pelo movimento dos investidores foi justamente o Brasil, que está a quatro meses de uma eleição presidencial em que o candidato do governo, José Serra, ainda não decolou. Nesse cenário, a especulação encontra terreno fértil, avalia o economista. “Temos fundamentos muito frágeis. Nosso déficit fiscal é enorme e a poupança interna, muito pequena. Com a eleição, a percepção do risco piora.”

Fábio Akira, economista-sênior do Banco BBV, discorda. Os últimos números da economia vêm sendo favoráveis, afirmou. Para ele, os motivos da alta do risco-Brasil são técnicos. “Mesmo porque houve notícias favoráveis aos olhos do mercado, como a confirmação de Rita Camata como vice de Serra, e a aprovação da CPMF no Senado”, lembrou.

Pesou também na disparada do risco-Brasil a alta do dólar. A moeda americana chegou a ser negociada a R$ 2,55, devido à grande procura por parte dos bancos. Muitas instituições apostaram, no início do ano, que as cotações permaneceriam estáveis, na faixa de R$ 2,30, e investiram em contratos futuros, os Forward Rate Agreements (FRA) de cupom cambial. Com a escalada do dólar, nas últimas duas semanas, a operação deixou de ser rentável e os bancos começaram a se desfazer de suas posições. Os prejuízos com esta aposta malfadada podem ultrapassar US$ 1 bilhão, segundo operadores do mercado.

Para zerar suas posições, os bancos tiveram que comprar moeda americana em larga escala, o que pressionou as cotações. O dólar comercial fechou vendido a R$ 2,528, em alta de 0,11%. A valorização da moeda americana é outro fator de aumento do risco-país, já que faz crescer a dívida pública – cerca de 30% dos títulos da dívida interna são atrelados ao câmbio.

O dólar ganhou ainda mais fôlego com a decisão do Banco Central de manter a taxa básica (Selic) em 18,5% ao ano. A medida preocupou analistas. “Sob a atual política monetária, estamos preocupados com a possibilidade de a economia brasileira permanecer frágil demais para suportar o explosivo crescimento da dívida de curto prazo”, assinalou relatório do banco Bear Stearns distribuído ontem a seus clientes. O banco alerta que os juros “assustadoramente” altos podem dar origem a um “ciclo vicioso”.

Marcelo Kischinhevsky