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É preciso uma nova revolta contra os tributos?

Guarulhos, 21 de abril de 2008

Passados 219 anos, a população brasileira – e a dos demais países da América Latina – está em uma situação semelhante à existente na época da Inconfidência Mineira, revolta que levou à forca, em 21 de abril de 1792, o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Entre os motivos da insurreição de 1789 estava a cobrança de impostos sobre a exploração do ouro das Minas Gerais. Os recursos recolhidos à Real Fazenda revertiam em escassos serviços para as comunidades. De lá para cá, o mundo mudou. Mas tanto no Brasil como nos países “hermanos” , os habitantes continuam a pagar uma alta carga tributária e a enfrentar um sistema de arrecadação extremamente complexo.

Sem chegar ao extremo de Tiradentes, contribuintes da região têm se manifestado contra o sistema tributário de seus países nos últimos anos. A classe média brasileira, por exemplo, se uniu em 2004 para derrubar medida provisória que pretendia aumentar os impostos para os prestadores de serviços. Duas mil entidades pressionaram o Congresso Nacional a não aprovar a medida. Conseguiram. No ano passado, pressões da sociedade acabaram com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

A classe média brasileira é a que mais recolhe Imposto de Renda (IR) na América do Sul. Estudo da consultoria Ernst & Young mostra que, considerando a faixa salarial de R$ 3 mil, a alíquota de 27,5% do IR é a mais alta entre os países da região. Na mesma faixa de renda, o trabalhador da Venezuela fica isento e o do Peru recolhe 15%. Segundo o estudo, a maioria dessas nações possui várias faixas de tributação de IR. O Brasil tem apenas duas.

Em março, milhares de argentinos fizeram um “panelaço” contra a tributação incidente sobre o setor agrícola. Assim como o Brasil, a Argentina sofre com a complexidade do sistema tributário. Estudo da consultoria PriceWaterhouseCoopers mostra que de um total de 178 países, a Argentina ocupa a 147ª posição do ranking, que leva em consideração o custo dos tributos, a quantidade de taxas e o tempo gasto na execução dos procedimentos necessários para pagá-los. O Brasil está melhor colocado, no 137º lugar.

O relatório, elaborado pelo Banco Mundial e PriceWaterhouseCoopers permite comparar os sistemas tributários do mundo. Na América Latina, o brasileiro só não é pior que o da Colômbia (167º), Bolívia (172º) e Venezuela (174º). Mas perde para o do Chile (34º), Equador (57º), Peru (77º), Uruguai (131º) e México (135º). Enquanto o percentual de impostos sobre a produção brasileira ficou em mais de 36% em 2007, no Uruguai foi de 29%; no Chile, de 19%; no México, de 20%; e no Peru, Bolívia e Colômbia, em cerca de 20%. Na Argentina, o percentual não foi fechado, mas deve ficar em aproximadamente 25%. Segundo o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBP), Gilberto do Amaral, antes da crise interna de 2007, era de 21%.

“Embora a carga dos países vizinhos seja menor, os serviços públicos prestados pelos governos são de qualidade semelhante aos do Brasil”, afirma Amaral. Para o diretor executivo do Instituto Fernando Braudel de Economia Mundial, Norman Gall, a maior diferença entre os países latino-americanos e o Brasil é o modo como os recursos são gastos. “O País tem uma capacidade impressionante de tributar, mas tem que pensar no futuro para investir.”

Na região, há ainda a tentativa de combater a burocracia. No Brasil, leva-se mais tempo para cumprir as obrigações tributárias: 2.600 horas por ano. Praticamente metade é relacionada ao Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e quase 500 horas, aos encargos trabalhistas. Estes, por sua vez, consomem 40,6% do lucro das empresas. A Bolívia precisa de 1.080 horas para atender às exigências e a Colômbia, 268 horas.