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O Fim das Pequenas Empresas

Guarulhos, 18 de março de 2004

Hoje em dia as grandes empresas desempregam mais do que contratam. São as pequenas e médias que geram emprego, aqui e mundo afora. Mas, em vez de fortalecer a pequena empresa, quase todos os governos do Brasil a ignoram ou a enfraquecem.

As pequenas e médias empresas são tipicamente dirigidas pela classe média alta, em torno de 10% da população brasileira. Se cada membro da classe média empregasse dez funcionários, não teríamos desemprego neste país. Teríamos 100% da população empregada, por definição. Hoje, com os inúmeros cursos disponíveis de administração, gerenciar uma empresa com dez pessoas não é coisa do outro mundo. O difícil é abrir e manter uma pequena ou média empresa no Brasil. A maioria das leis, voltadas para conter a grande empresa, acaba contendo a pequena e a média.

Entre no Google e pesquise os assuntos mais tratados pelos nossos economistas e governantes – os temas mais freqüentes são juros, inflação e câmbio. “Pequenas e médias empresas” raramente fazem parte do temário de discussão. Ajudar a pequena e a média empresa a crescer, nem pensar.

Estamos assistindo a uma sistemática destruição desse setor no Brasil, de roldão, de nossa classe média. Os ricos com suas grandes empresas já não criam mais empregos e os pobres não têm como gerá-los. Denegrir e dizimar a classe média por seus “valores pequeno-burgueses” pode ser uma grande vitória política, mas será um enorme suicídio econômico.

De vinte anos para cá, além de aumentarem os impostos, reduziram os prazos de pagamento desses impostos de 120 para quinze dias. Hoje, as empresas precisam pagar 40% de sua receita ao governo antes de receber de seus clientes. O capital de giro dessas empresas sumiu; em vez de financiar a produção, financia o governo.

Não é a economia informal que está crescendo, é a economia formal e a classe média que vêm sendo destruídas, e rapidamente. Estudo realizado pelo Sebrae, e apresentado por Alencar Burti, estima que 31% das pequenas empresas quebrarão até 2005. Ou seja, não somente não irão empregar ninguém como vão desempregar aqueles que já têm emprego.

Não é exatamente uma previsão fora de propósito, porque a grande maioria dessas empresas não obtém lucro há mais de três anos, e 90% delas não possuem mais capital, muito menos capital de giro. Se levarmos em conta os encargos fiscais em atraso, os Refis, os processos trabalhistas a pagar, a maioria está com patrimônio negativo, ou seja, encontra-se literalmente quebrada. Muitas não fecham imediatamente porque não podem pagar os elevados custos da demissão dos funcionários. Vão levando, na esperança de que as coisas melhorem. A maioria dos pequenos e médios empresários nem pensa mais em crescer, mas em vender suas empresas assim que a economia melhorar.

Até recentemente, as empresas médias sobreviviam sonegando um ou outro dos 46 impostos a pagar. Sonegavam o suficiente para se manter vivas. Hoje não dá mais para sonegar. Ou se sonega tudo, devido ao excelente controle e amarrações entre os órgãos arrecadadores, ou não se sonega nada. Como sonegar todos os impostos dá cadeia, e não sonegar nenhum significa falência em alguns anos, a saída é fechar a empresa assim que for possível.

Ainda segundo estimativas de Burti, 59% das pequenas e médias empresas fecharão as portas em 2009. Essas estatísticas não são exageradas. O número de insolvências nesse segmento sempre foi elevado, só que antigamente cinco novas empresas eram criadas para cada quatro que quebravam.

Hoje não. Não vejo mais aquela vontade de ser empresário e empreendedor no Brasil, muito pelo contrário. Entre abrir uma pequena empresa e arrumar um emprego público, os filhos da classe média estão preferindo a opção mais segura. E eles têm razão.

Quando baixarem os juros dos empréstimos, nossos intelectuais vão descobrir que não haverá mais classe média para tomá-los, não haverá administrador de empresas querendo administrá-los, não haverá engenheiro querendo empregá-los.

Em sua opinião, quem tem mais condições de gerar os empregos de que este país necessita? Nossos intelectuais, nossos economistas, nosso governo ou nossa classe média? É uma interessante questão para ser discutida ao longo desta semana.

Stephen Kanitz é administrador por Harvard (www.kanitz.com.br)

Revista Veja, Editora Abril, edição 1845, ano 37, nº 11, 17 de março de 2004