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Retrospectiva 2001

Guarulhos, 28 de dezembro de 2001

Em apenas um ano, Argentina vive o caos

AP

Filas nos bancos argentinos após anúncio de pacote econômico

A Argentina atravessou o ano em crise. Pacotes econômicos, empréstimos do FMI e medidas de estímulo à economia se seguiram com alternância e insucessos impressionantes. Somente em 2001, o Ministério da Economia foi ocupado por três nomes diferentes. E os boatos da saída do ministro da Economia, Domingo Cavallo, e do presidente, Fernando de la Rua, são incalculáveis.

Já em março de 2001, a péssima condição financeira do país e a crise política motivaram a saída do ministro da Economia, Jose Luis Machinea. Seu substituto, Ricardo Lopez Murphy, entrou em ação com uma proposta de profundos cortes nos gastos. A repulsa social e política ao pacote foi enorme, e depois de apenas duas semanas no cargo o ministro pediu demissão.

O caos se apresentava com veemência. Mas então surgiu a possível salvação: Domingo Cavallo, o pai da “conversibilidade” – sistema que atrelou o câmbio do peso ao dólar norte-americano e garantiu que para cada peso em circulação sempre haveria um dólar em reserva – e artífice do fim da inflação voltou ao comando da economia local.

Poucos dias depois de sua posse, o ministro recebeu poderes especiais do Congresso e implantou um pacote de austeridade ainda mais abrangente do que o proposto pelo ministro anterior. O FMI (Fundo Monetário Internacional) pareceu confiar na inovação e liberou novo empréstimo ao país, desta vez de US$ 13,4 bilhões.

Contudo, o problema não era tão simples: a paridade cambial efetivamente retirava a competitividade dos produtos argentinos, que por possuírem denominação e custos em dólares simplesmente não conseguiam competir em um mercado internacional que já recuava diante da desaceleração que se desenvolvia nas principais economias mundiais, notadamente a dos Estados Unidos.

Em junho, Cavallo realizou o primeiro swap de títulos (troca da dívida), que envolveu US$ 29 bilhões. Um mês depois, o pânico explodiu novamente: os temores de moratória motivaram aumento descontrolado do risco-país (ágio suportado pelos títulos em relação ao rendimento pago pelos Títulos do Tesouro dos EUA, considerados os mais seguros do mundo). A Bolsa argentina mergulhou.

Pacote de austeridade

Com as possibilidades de moratória e desvalorização sendo avaliadas, o governo aprovou em dias o “pacote de austeridade”, que cortou drasticamente os gastos da máquina administrativa, sem contar a redução de 13% imposta aos vencimentos de servidores públicos e aposentados. A medida encorajou o FMI, que concedeu novo resgate ao país, agora de US$ 8 bilhões.

Mas as medidas de austeridade não convenceram o mercado, pois não abordaram os problemas estruturais: a paridade cambial continuava a perseguir a competitividade do país e o regime de déficit zero proposto por Cavallo, em julho, se mostrou quase inviável diante do espiral de queda das receitas tributárias. Resultado: a Argentina amarga três anos de recessão.

Após a desastrosa derrota do governo nas eleições do Congresso em outubro, o descontrole político tomou a agenda. As Províncias controladas pela oposição do Partido Peronista simplesmente não aceitavam novos cortes de gastos nem nos repasses mensais de arrecadação fiscal federal, e muitas decretaram moratória.

A instabilidade financeira cresceu e em meio à corrida bancária dos argentinos (que temiam confiscos, congelamentos e outras investidas de controle que o Estado no passado impusera), o país realizou a operação local de reestruturação da dívida, classificada pelas agências de risco como um calote disfarçado.

No início de dezembro veio o golpe final: o FMI visitou Buenos Aires, analisou as contas e não aprovou o desembolso da parcela de US$ 1,2 bilhão prevista para a segunda quinzena do mês e que seria utilizada no serviço da dívida externa. O governo, em desespero, anunciou medidas de controle bancário e cambial para barrar a fuga de dólares do país.

Agora, o governo De la Rúa tenta fazer novos cortes nos gastos para aprovar o Orçamento de 2002, condição estabelecida pelo Fundo para o desembolso de novos recursos. Enquanto isso, os rumores (e indicações) de moratória e desvalorização crescem em escopo e importância, deixando em suspense não apenas os mercados emergentes, mas toda a comunidade financeira internacional.

Real nocauteado

Quando o dólar encerrou cotado a R$ 2,8, no dia 20 de setembro, o céu parecia ser o limite. A apreciação chegava a 44,5% e o apetite dos investidores por “hedge” (proteção) se mostrava insaciável. Eis que a bolha do dólar começou a estourar. Está certo, a valorização de 20% no ano é alta. Muito alta. Mas a tendência no momento é de queda e a percepção do prêmio de risco dá sinais a cada dia que o Brasil descolou da crise Argentina. Os fundamentos macroeconômicos, como gosta de pregar a equipe econômica, oferecem uma garantia aparente que o efeito Orloff não veio para derrubar o Plano Real.

Pouso da águia

Depois de 10 anos de expansão econômica os Estados Unidos entraram, oficialmente, em recessão. Os ataques de 11 de setembro ajudaram a aprofundar a estagnação, mas não foram o estopim da crise. A economia já dava sinais de desaquecimento meses antes de encerrar o segundo mandato do presidente Bill Clinton. O golpe fatal veio em março deste ano. E uma vez que os EUA estão em desaceleração, aparentemente não há outro país candidato a preencher a vaga de motor do mundo. O resto do mundo agora está caindo como peças de dominó – primeiro os países asiáticos (excluindo o Japão), depois o próprio Japão, em seguida os parceiros dos Estados Unidos no Nafta e agora a Europa e a América Latina.

Greve na Petrobras

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Funcionários da Petrobras fazem protesto durante greve

Os petroleiros fizeram greve do dia 25 ao dia 29 de outubro, reivindicando reajuste de 62,8% no salário, segurança e estabilidade de emprego. Aceitaram a proposta da Petrobras, de aumento de 6,4% nos salários, mais benefícios. Nos cinco dias de greve, a empresa deixou de produzir 4,2 milhões de barris de petróleo e 20 milhões de m³ de gás. Os prejuízos estimados foram de US$ 100 milhões. A Petrobras afirma que o refino do óleo não foi comprometido.

Quebradeira no turismo

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Soletur entra com pedido de falência

Com uma dívida de R$ 30 milhões e patrimônio declarado de R$ 25 milhões, a Soletur entrou com ação de autofalência no dia 24 de outubro, e já no dia seguinte os escritórios da empresa não abriram. A falência foi decretada em 5 de novembro pelo juiz Alexander dos Santos Macedo, que também tornou temporariamente indisponíveis os bens dos sócios e decretou a quebra de sigilo fiscal e bancário dos empresários. Os funcionários (450), clientes (cerca de sete mil) e outras empresas só devem começar a receber em 2003 o dinheiro que a Soletur deve, sem a garantias de restituição integral.

Classe média esquecida

A Caixa Econômica Federal suspendeu no dia 31 de agosto os empréstimos para quem ganha acima de R$ 2 mil mensais e queria adquirir um imóvel novo, usado ou na planta. A medida atingiu principalmente a classe média. Em meados de novembro, a Caixa conseguiu um empréstimo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), no valor de R$ 1 bilhão e, no começo do próximo ano, deve voltar a fazer os financiamentos de imóveis para a classe média.

Mercosul em crise

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Cavallo (com Malan) fez fortes ataques ao Brasil

2001 é um ano para ser esquecido nas relações entre Brasil e Argentina pelos coices do ministro da Economia, Domingo Cavallo. Com um discurso afiado, ele pregou o fim do real, culpou a moeda brasileira pela crise do país vizinho e clamou por um gatilho cambial. Resultado: o Brasil suspendeu as negociações com a Argentina. Na retomada dos diálogos ficou acertado medidas de salvaguardas nas relações comerciais. Na prática, isto que dizer que alguns produtos argentinos ganham proteção com a elevação de tarifas de similares brasileiros.

Maior acordo coletivo do mundo

No dia 29 de junho foi sancionado o projeto de lei complementar (PLC-195/01), que determina o pagamento das perdas no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) provocadas por expurgos dos planos econômicos Verão (16,64%) e Collor I (44,8%). O custo do ressarcimento é estimado em R$ 40 bilhões. O prazo para adesão do trabalhador ao acordo é dezembro de 2003. A Caixa deve entregar aos trabalhadores até abril de 2002 os valores a que cada um terá direito. O pagamento das diferenças começará em junho próximo para quem tem até R$ 1 mil a receber e será feito de uma vez, sem desconto.

Brasil volta ao FMI

O governo esperava que suas contas terminassem o ano no azul, sem problemas. Veio a crise da Argentina. O dólar disparou e o mundo passou a desconfiar das economias emergentes, como a do Brasil. Resultado: o governo voltou a pedir a ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI). A equipe econômica foi aos Estados Unidos e, depois de uma negociação recorde, voltou com US$ 15,6 bilhões no bolso. Em compensação, o FMI exigiu do País disciplina ainda maior de suas contas. O prazo para o pagamento do empréstimo termina em setembro de 2002.

Inflação no buraco

“A meta de inflação deste ano é de 4%, com folga de 2 pontos percentuais para cima ou para baixo”, repetia enfaticamente o ministro da Fazenda, Pedro Malan, desde o começo do ano. Os preços, portanto, poderiam subir no máximo 6%. O Banco Central jogou os juros para cima para segurar o aumento dos preços. Não deu. Os especialistas prevêem que a taxa feche o ano em 7,34%. Mesmo com a meta já ultrapassada, o BC não desiste, e os juros não devem cair até o começo de 2002.

Tesoura do Fed

AP

Alan Greenspan passou a tesoura no juro dos EUA

No começo do ano a taxa de juros dos Estados Unidos estava em 6,5%. Encerrou em 1,75%, menor nível em 40 anos. Foram onze cortes em apenas um ano. Inflação em dia e a desaceleração da economia motivaram o Federal Reserve a atuar de forma agressiva na política monetária. Os resultados desta operação ainda não surtiram efeito, de acordo com estudo da autoridade monetária a redução dos juros é notada na economia após 18 meses. Lição de casa feita, os EUA agora torcem por uma rápida recuperação.