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Piratas afundam empresas

Guarulhos, 26 de maio de 2003

A falsificação de produtos no Brasil já movimenta anualmente cerca de 5% do Produto Interno Bruto, PIB, o equivalente a R$ 50 bilhões (ou US$ 22,8 bilhões). Os números são alarmantes. Nada menos do que R$ 10 bilhões em impostos deixam de ser arrecadados com a pirataria todos os anos. Só na indústria fonográfica, 30% dos CDs vendidos são falsificados. O problema já contribuiu até para o desaparecimento quase completo dos fabricantes de fitas cassetes. Mas, apesar de todo o estrago, o governo demonstra pouco empenho em impedir o livre comércio de mercadorias ilegais.

Para se ter uma idéia, apenas 100 fiscais são encarregados de supervisionar os quatro mil postos de arrecadação em todo o País. A pirataria já é tão escancarada que no centro de São Paulo camelôs vendem tranqüilamente de CDs a camisetas e tênis de marcas patenteadas falsificados. Filmes que acabaram de estrear nos cinemas podem ser facilmente encontrados em cópias ilegais nas barracas dos ambulantes – ou mesmo na internet.

“Se nada for feito, o problema pode ganhar uma dimensão até maior do que a do narcotráfico, com infiltrações em todos os setores da economia”, diz Vander Giordano, diretor da Kroll, empresa especializada em consultoria empresarial, que organizou na semana passada um debate sobre o assunto, em São Paulo.

O alerta feito pela Kroll merece no mínimo uma reflexão, já que vem de uma empresa que esteve à frente de investigações de casos famosos, como as acusações de corrupção contra o então presidente Fernando Collor de Mello e o seu tesoureiro de campanha, que acabaram sendo usadas como ponto de partida para o impeachment presidencial.

Giordano diz que se não houver uma união de empresários e pressões sobre o governo muitos setores tendem a desaparecer nos próximos cinco anos. “Foi isso o que aconteceu com o segmento de fitas cassetes. A maior parte das empresas legais tiveram que fechar as portas por causa da concorrência desleal dos falsificadores”, afirma.

Público e privado – O consultor defende a criação de uma secretaria de fiscalização como forma de o governo federal combater a pirataria. Para ele, essa seria uma maneira de monitorar todos os números de falsificações e buscar soluções em esfera nacional, em vez de tentar resolver o problema caso a caso.

Segundo Giordano, o setor privado também poderia se unir a fim de encontrar alternativas para dificultar a pirataria. “Depender apenas de ações do governo é um erro, porque enquanto elas não acontecem, estamos assistindo ao fechamento de empresas”.

As associações de classes e os institutos de ética são apontados pelo executivo como um caminho para essa união. “Uma voz sozinha não tem força. É preciso que os setores se unam, como tem feito o segmento de combustível a fim de acabar com o problema da gasolina adulterada”, explica.

Efeito mundial – Nos Estados Unidos e no resto do mundo a falsificação também tem feito estragos. Só nos Estados Unidos, 90% da indústria fonográfica já está nas mãos da pirataria, estima a Kroll. Por ano, o país perde US$ 200 bilhões em falsificações. E esse número chega a US$ 400 bilhões na esfera mundial.

“A situação nos Estados Unidos chegou a um ponto que o governo desconfia de que a pirataria serviu até para financiar o atentado terrorista de 11 de setembro”, diz o advogado José Henrique Vasi Werner, do escritório Dannemann Siemsen, que há 100 anos trabalha com Direito de Propriedade Intelectual e Patentes.

Werner diz que o próprio chefe de operações do FBI, Jim Moody, tem uma visão triste sobre o tema. “Ele já afirmou em diversas oportunidades que a pirataria no mundo deve ser o crime mais praticado durante o século 21.”

O advogado diz que é preciso que o empresário brasileiro crie o hábito de denunciar à Justiça empresas que estejam trabalhando de forma suspeita. Também defende a maior conscientização da população. “Quando compram produtos de origem duvidosa, as pessoas estão alimentando a indústria da pirataria. Como os produtos são de qualidade inferior podem causar danos à saúde”, diz.

De acordo com o vice-presidente da Souza Cruz, Hilton Cabral, que também participou de um seminário sobre o tema na semana passada, o material usado na fabricação de cigarros falsificados não segue as normas exigidas por lei. Por isso, elevam as chances de problemas respiratórios e câncer. Dados do setor, indicam que de cada três cigarros acesos no País, um é falsificado.

Adriana Gavaça