Norma da Receita restringe créditos de PIS
Uma nova norma inviabiliza, na prática, o pagamento da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) de forma não-cumulativa pelas empresas prestadoras de serviços. Um ato declaratório assinado pelo novo secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, mostra que a fiscalização aplicará uma interpretação da legislação que praticamente anula a possibilidade de as prestadoras descontarem do PIS devido a contribuição paga na aquisição de insumos.
'Isso prejudica imensamente as prestadoras de serviço, segmento que pela interpretação mais favorável da legislação, já eram as que mais perdiam com o novo cálculo não-cumulativo do PIS', diz o advogado Guilherme Pereira das Neves. “Com a interpretação que a Receita está divulgado, as prestadoras obrigadas ao novo cálculo do PIS passaram a pagar uma contribuição que subiu de 0,65% para 1,65% e não terão quase nenhuma oportunidade de crédito.'
Na verdade, dizem os especialistas, a Receita Federal está aumentando a carga tributária sobre o segmento prestador de serviços tirando proveito do que está sendo considerado um “acidente de percurso” na redação final da Medida Provisória (MP) da minirreforma tributária.
A alteração aconteceu entre o texto original e o final da MP nº 66/2002. Com a troca de um “na” por um “à” num dos incisos do artigo terceiro da medida, houve uma mudança significativa no sentido do dispositivo.
O texto antigo estabelecia que as empresas podiam se creditar do PIS pago em bens e serviços usados na prestação de serviços. Com a troca do “na” pelo “à', a nova redação estabeleceu que a empresa poderá se creditar somente do PIS pago em bens e serviços adquiridos para a fabricação de produtos a serem utilizados na prestação de serviços.
Ou seja, pelo texto original, uma companhia aérea, por exemplo, poderia descontar do PIS devido a contribuição paga na aquisição de bens e serviços destinados à prestação de seus serviços. Pelo novo texto, a companhia aérea se credita somente do PIS pago na aquisição de bens e serviços que, por exemplo, usar na fabricação de uma aeronave que seja utilizada na prestação de serviços.
A troca no texto final da MP foi detectada pelos tributaristas logo depois que a medida foi sancionada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso e convertida na Lei nº 10.637/2002. “A modificação foi vista, porém, como uma distração na revisão no texto', lembra o advogado Flávio Munhoz. “Eu não acreditei que a Receita se utilizaria disso para impor uma interpretação mais restrita aos créditos do PIS.'
O entendimento da Receita Federal ficou claro com a edição do Ato Declaratório Interpretativo nº 2/2003, publicado no último dia 18. Em um dos dispositivos da norma, a Receita claramente estabelece que os créditos de PIS somente serão concedidos a bens e serviços usados em produtos que venham a ser utilizados na prestação de serviços ou na venda. O ato declaratório interpretativo é um tipo de norma baixado para esclarecer o entendimento oficial da Receita sobre determinado assunto. Ao proceder uma fiscalização, os auditores deverão seguir o que estiver estabelecido no ato declaratório.
A restrição imposta pelo Fisco deverá afetar todas as prestadoras, com exceção daquelas que não estão obrigadas ao cálculo do PIS pela nova fórmula. Entre elas, estão as empresas que pagam Imposto de Renda (IR) pelo lucro presumido e os serviços que estão submetidos à substituição tributária da contribuição.
'Essa é uma interpretação literal que não faz nenhum sentido frente a todo a discussão sobre o regime não-cumulativo que se pretendeu adotar no PIS', argumenta a advogada Ana Cláudia Akie Utumi.
'Ao que tudo indica, não houve intenção de nenhum parlamentar em restringir dessa forma a possibilidade de crédito pelas prestadoras de serviço. Foi uma questão de revisão de texto', diz um dos primeiros tributaristas a notar a mudança de redação, o advogado Gustavo Lian Haddad. Para ele, as empresas podem defender judicialmente a anterioridade de 90 dias a partir da Lei 10.637/2002. Pelo ato declaratório da Receita, o cálculo restritivo está de pé desde 1º de dezembro último.