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Taxas encarecem carro a “juro zero”

Guarulhos, 22 de abril de 2002

As campanhas de “juro zero” têm sido um expediente utilizado pelas montadoras para alavancar vendas de automóveis, mas não há milagres. Com o custo de captação a 1,49% ao mês, a margem para subsidiar as taxas dos veículos vendidos a prazo é pequena. Nesta segunda fase da promoção – iniciada no dia 5 e que se estende ao longo do mês para três grandes fabricantes – nota-se que acréscimos decorrentes da tarifa de abertura de crédito (TAC) e do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) podem encarecer o bem de forma considerável.

“O juro é zero, mas o custo da operação não é”, diz o matemático e professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC), José Nicolau Pompeo. “É preciso ficar atento, porque o juro pode estar maquiado na TAC, nos preços diferenciados à vista e a prazo e até mesmo na cobrança do IOF que não é um cálculo fácil para o consumidor. Muitas vezes, aquilo que se chama de IOF inclui um fator inadimplência, que está incorporado ao financiamento.”

Em concessionárias pesquisadas das marcas Ford, Chevrolet, Fiat e Renault, nunca o preço da compra financiada equivale ao que se pagaria à vista, por conta da inclusão da TAC, que varia de R$ 145 a R$ 180, mais 1,5% ao ano de IOF sobre o total financiado. Caso de um Corsa Hatch 1.0 cotado numa revendedora Chevrolet, que sai a R$ 21 mil à vista e R$ 21,06 mil no plano financiado; na Renault, um Clio 1.0 16 V passa de R$ 19,5 mil para R$ 19,7 mil, com custos adicionais de 0,13% e 0,37% ao mês, respectivamente. Um Fiesta 4P vale R$ 15,9 mil à vista e R$ 16,2 mil no plano financiado, com acréscimo de 0,59%.

Na concessionária Amazonas, da marca Fiat, um Palio EX 4P passa, entretanto, de R$ 17,8 mil à vista para R$ 18,4 mil. O custo mensal embutido é de 1,63%. A TAC informada é de R$ 180 e os outros R$ 498,16 são referentes ao IOF e um seguro prestamista. “É uma exigência do banco. Sem isso, o financiamento não sai”, diz o responsável pela área financeira Carlos Carneiro. Em outra revendedora da marca, a Autosole, um modelo duas portas com bônus sai a R$ 17,35 mil à vista. No plano financiado, o preço de referência é de R$ 17,58 mil e o valor final do parcelamento salta para R$ 18 mil. Na diferença de R$ 426,56 também tem TAC, IOF e seguro. “Não é obrigatório. O cliente faz a opção na hora de fechar o negócio”, diz o gerente de vendas José Carlos Guerrero. Na primeira abordagem com um vendedor da loja, isso não foi esclarecido.

O diretor do Banco Fiat e presidente da Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef) nega que a contratação do seguro seja compulsória.”O banco agradece se alguém faz o prestamista, pois dá a tranqüilidade de que a prestação continuaria sendo paga independente da situação financeira de quem contratou o empréstimo, mas não é obrigatório.” O produto é oferecido pela Cigna ou pela Fênix, seguradora ligada ao grupo Fiat.

Croppo elucida que, nas campanhas de “juro zero”, o preço a prazo tem que ser igual ao à vista, conforme estabelecem as regras da promoção. “Nos anúncios tem que estar claro que existem os custos adicionais e o que tiver a mais do que isso merece esclarecimento de quem está vendendo.” Para ele, o marketing dos planos sem juros tem bom apelo, mas o subsídio é economicamente questionável para as financeiras. “Há momentos e momentos para este tipo de campanha. Copiamos dos Estados Unidos com o objetivo de provocar o consumidor após os eventos do apagão, da Argentina e dos ataques terroristas, quando caía de forma considerável a demanda de bens de alto valor unitário.”

O técnico do Procon-SP, Paulo Góes, reitera que o preço à vista tem que ser idêntico ao total financiado, salvo os encargos. Na primeira versão da campanha, o órgão de defesa não encontrou irregularidades.

O presidente da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automorores (Fenabrave), Hugo Maia, considera que o excesso de campanhas está banalizado, o que causa insegurança. “Está na hora de as montadoras enfrentarem o mercado e colocar o preço que o consumidor pode pagar.” Na tabela utilizada nos planos de consórcio estaria o elemento inibidor de preços mais baixos, na opinião do presidente do Instituto Brasileiro dos Executivos de Finanças (Ibef), Carlos Alberto Bifulco. “No consórcio, sempre se cobra o preço cheio e o plano sem juros funciona como abatimento.”

O economista e matemático José Dutra Sobrinho reconhece que a comunicação do “juro zero” pode ser equivocada em alguns casos, mas considera que o consumidor que compra a prazo não está sendo enganado, pois paga um dos custos de crédito mais baixos do mercado. “Quem compra à vista é que precisa ficar de olho para conseguir descontos compatíveis.”

A isca do “juro zero” tem funcionado. O diretor do grupo Carrera, Isaac Azar, que representa as marcas Ford e Chevrolet, diz que a campanha incrementou em 30% o movimento das lojas. As vendas efetivas subiram 15%. Toda linha Ford está na promoção e, de acordo com o executivo, a demanda pela picape F-250 foi a grande surpresa. Com preço a partir de R$ 49,7 mil, a categoria tem como principais concorrentes os importados. “Normalmente vendemos uma picape dessas por mês. Com a promoção, vendemos três.” Segundo o diretor comercial da Carrera Chevrolet, César Pina, o Corsa representa mais de 60% de suas vendas nesta campanha. “Para os carros pagos à vista, a média de desconto é de 4%”, diz.