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Brasil pode ficar fora da Alca

Guarulhos, 10 de maio de 2002

A Área de Livre Comércio das Américas (Alca) pode não sair do papel ou pode ser criada sem alguns países, entre os quais o Brasil. Essas possibilidades foram admitidas hoje pelo ministro do Desenvolvimento, Sérgio Amaral, que fez a palestra de encerramento do XIV Fórum Nacional realizado no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “Estamos diante de uma realidade em que é possível que não exista Alca, mas que existam acordos bilaterais e multilaterais com outros países latino-americanos”, disse.

Logo depois do evento, o ministro explicou que o Brasil continua trabalhando para a Alca e considera que teria importantes oportunidades para o País. Mas ressaltou: “Precisamos admitir a hipótese de que a Alca não seja concluída ou que a Alca constituída não seja aquela que atenda aos nossos interesses.” Em outro momento, o ministro afirmou que, se a Alca não atender aos interesses brasileiros, o Brasil não vai participar.

Segundo Amaral, houve uma mudança de posição política dos países e “hoje aparentemente os Estados Unidos parecem ter mais dificuldades para pôr as questões reais sobre a mesa do que o Brasil”. Ele citou que o Brasil e a Argentina são os maiores exportadores agrícolas do continente para os Estados Unidos. “Mas quase todos os produtos agrícolas estão na lista de exceções do TPA (Trade Promotion Authority, que dá ao Executivo norte-americano autorização para negociar acordos de comércio exterior).”

Amaral disse também que “houve uma mudança de preocupações dos países” e que se vê mais no Brasil setores que têm melhores condições de competir e de se beneficiar e nos Estados Unidos se vê mais setores que estão se valendo de medidas protecionistas, e fechando o mercado em setores como aço e agricultura.

O ministro de Relações Exteriores, Celso Lafer, que abriu o painel de hoje do Fórum Nacional e não estava presente durante a palestra de Amaral, também condenou o protecionismo americano, assim como o da União Européia. “Deve-se notar que essas manifestações de caráter protecionista exercem efeito negativo sobre os processos negociadores, na medida em que abalam a política de confiança inerente a esses mesmos processos”, disse Lafer. “Com essa possibilidade de ficar fora da Alca, é fundamental que o Brasil esteja “em todas as mesas de negociação”, segundo Amaral.

Nesse sentido, o ministro do Desenvolvimento defendeu que o Mercosul continue negociando acordos bilaterais e multilaterais dentro do continente, como o que foi fechado recentemente com o Chile, o acordo que, segundo ele, sairá em poucas semanas com o México e o que está em preparação com o Pacto Andino. Amaral não mencionou, mas o Brasil está negociando um acordo também com o Canadá, parceiro dos Estados Unidos e do México no Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta). No entanto, ao se referir ao acordo com o Canadá, o ministro de Relações Exteriores, Celso Lafer, disse que o mercado canadense “é importante, mas não tem a amplitude dos mercados da União Européia e dos Estados Unidos”.

ICMS

Amaral também anunciou que o governo está preparando um projeto de securitização de créditos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) que tem por objetivo resolver uma das principais queixas dos exportadores quanto à carga tributária. Hoje o exportador de commodities tem a isenção do ICMS na exportação de seu produto, mas o exportador de produtos de maior valor agregado, embora tenha o direito de compensar esse crédito, na prática não consegue exercê-lo.

A razão é que governos estaduais se recusam a compensar crédito de ICMS referente a uma etapa da cadeia produtiva, como o fornecimento de matéria-prima, por exemplo, para os exportadores que fabricam seu produto final em outro Estado.

Segundo Amaral, “a saída é a securitização desse crédito para que ele possa ser negociado e compensado em outros impostos”. Ele explicou que essa compensação, pela proposta do governo, poderá ser feita tanto com impostos federais como com impostos de outro Estado, que não o do crédito original do ICMS. Amaral afirmou que a dificuldade dos exportadores em compensar os créditos de ICMS “vai contra todo o esforço do governo para aumentar o valor agregado dos produtos” da pauta de exportação brasileira.

Amaral defendeu a criação de uma Câmara de Política Industrial para unir e articular ações de política industrial dos vários ministérios, como o do Desenvolvimento, o Itamaraty e a Fazenda.

Amaral ainda criticou “a ambigüidade de certos candidatos quanto a seus compromissos de governo”. De acordo com ele, essa é a causa “da volatilidade de alguns indicadores econômicos de curto prazo, como os de bolsa de valores e taxas de câmbio”, mais do que as variações das pesquisas de opinião, cinco meses antes da eleição.

O ministro disse haver hoje um consenso em torno de dar prioridade às exportações e reduzir o déficit externo. “Houve uma percepção progressiva de que as exportações são importantes e a própria desvalorização de 1999 é um exemplo disso”, afirmou.

Adriana Chiarini