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“Seguro antiapagão” já está na conta

Guarulhos, 01 de abril de 2002

Ele chegou de repente, veio de maneira discreta e pouca gente se deu conta, mas, desde o dia 1.º de março, o Encargo de Capacidade Emergencial (ECE) está sendo cobrado na conta de energia elétrica dos consumidores residenciais, comerciais e industriais. Somente os consumidores residenciais classificados como de baixa renda estão isentos do pagamento do ECE.

Esse encargo – chamado por alguns de “seguro antiapagão” – está sendo cobrado na fatura de energia elétrica e é proporcional ao consumo individual verificado. O valor é de R$ 0,0049 por quilowatt/hora. De maneira simplificada, o ECE está sendo pago para que as usinas termoelétricas fiquem à disposição da Comercializadora Brasileira de Energia Emergencial (CBEE), empresa criada pelo governo para comprar energia no caso de ocorrer uma nova crise.

O que muita gente não sabe, no entanto, é que o ECE é apenas um dos três encargos descritos na Resolução n.º 71 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que regulamenta a Medida Provisória (MP) n.º 14. Se a energia das termoelétricas for efetivamente usada, os consumidores terão de pagar ainda o Encargo de Aquisição de Energia Elétrica Emergencial. Se a crise, porém, atingir níveis extremos e houver a necessidade de comprar energia extra no Mercado Atacadista de Energia (MAE), um terceiro valor incidirá nas contas dos consumidores, o Encargo de Energia Livre Adquirida no MAE.

Especialistas na área de defesa do consumidor estão estarrecidos com a situação. As irregularidades na cobrança de tais encargos são tamanhas que a Pro Teste – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor – entrou com uma ação civil pública contra a União e a Aneel.

Cobrança é inconstitucional

“Nós entendemos que essa cobrança é inconstitucional. Primeiro porque o artigo 170 da Constituição coloca como um dos fundamentos da atividade econômica a livre iniciativa, o que significa assumir riscos”, afirma a advogada Flávia Lefèvre, membro do conselho diretor da Pro Teste.

“Esse risco não está sendo assumido nem pelas geradoras de energia, nem pelas distribuidoras e está sendo repassado para o consumidor.”

Outra ilegalidade refere-se ao artigo 175, que impõe ao Poder Público a obrigatoriedade da prestação dos serviços públicos. Flávia lembra, porém, que o governo tem esse direito, o de arrecadar dinheiro entre os cidadãos.

“No entanto, estaríamos falando de um tributo que teria de ser regulamentado por lei complementar e não por uma medida provisória, como foi o caso desse encargo.” Isso está no artigo 146 da Constituição.

Também é questionável o valor da energia que pode ser comprada. “A distribuidora paga para a geradora R$ 35 pelo megawatt/hora e a CBEE está pagando para as usinas termoelétricas por volta de R$ 70 o megawatt/hora, só para ficarem de stand by.”

“O consumidor já passou por uma série de dificuldades e teve prejuízos por causa da crise que o País enfrentou. Teve de economizar a duras penas, teve de se privar de algum conforto, quem não conseguiu precisou pagar uma sobretaxa – com o risco de ter o serviço suspenso”, avalia a assistente de direção do Procon-SP, Sônia Cristina Amaro.