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Sistema de crédito precisa ser revisto

Guarulhos, 06 de agosto de 2002

Para o economista Marcio Pochmann, secretário de Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade na Prefeitura de São Paulo, o atual sistema de crédito é inadequado às necessidades do mercado, pois devia focar a produção. O BNDES , diz, está viciado na burocracia dos bancos.O encarecimento do crédito afeta empresas, comércio e consumidores. Também deixa o País um pouco mais pobre, na medida em que reduz o crescimento do Produto Interno Bruto, PIB, brasileiro.

Para o economista Marcio Pochmann, secretário de Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade na Prefeitura de São Paulo, o custo elevado é o grande vilão do crédito no Brasil. Mas não está sozinho. O atual modelo de financiamento, diz, é inadequado às necessidades do mercado e portanto tem de ser revisto. Na sua opinião, o setor de crédito precisa de menos burocracia e mais foco no sistema produtivo. Hoje, segundo ele, o crédito tem sido mais usado para pagar dívidas do que como investimento na produção.

Pochmann fala dos problemas do crédito no Brasil, da atuação burocrática do BNDES no mercado de crédito e do projeto da Prefeitura, criticado pelo BNDES, na concessão de financiamentos sem burocracia.

Custo inibe procura

A política econômica atual estabeleceu um custo muito elevado para os empréstimos em geral. Acho que o Brasil tem uma oferta de crédito que está acima da demanda (o volume total de crédito no mercado em junho foi de R$ 207,1 bilhões, segundo o Banco Central, contra R$ 201,8 bilhões em maio). Olhe para o crédito disponível para operações habitacionais, por exemplo. A demanda é baixa em função da instabilidade econômica, da insegurança do trabalhador em relação a seu emprego e, por isso, não arca com taxas elevadas de juros (a média geral, em junho, era de 59,6%, segundo o BC).

Com isso, muitas empresas optaram por tomar empréstimos no Exterior porque o custo era menor. Sistema atual de crédito precisa ser redesenhado A oferta que temos hoje de crédito é inadequada às necessidades do mercado e principalmente do consumidor, tanto a empresa quanto a pessoa física. O País não tem um projeto claro de desenvolvimento, de investimento na produção. Fala-se apenas em metas de inflação. As empresas que fazem investimentos muitas vezes utilizam recursos internacionais.

O BNDES, um dos maiores bancos de investimento do mundo em termos de folha e de ativos de crédito, que poderia resolver parte do problema de crédito no País, tem uma grande dificuldade em emprestar os recursos. O sistema perdeu o foco e por isso precisa ser revisto. Precisamos de um sistema que esteja mais voltado para o setor produtivo. Que não seja tão burocrático. Imagino uma rede de instituições, formada a partir do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, que operasse o crédito de forma menos burocrática que a atual.

Sistema bancário hoje se mostra inadequado

Uma parcela importante do setor produtivo, e também dos consumidores, não tem acesso ao sistema bancário tradicional. Ou seja, nós constituímos o sistema bancário, mas ele hoje se mostra inadequado para o perfil da economia brasileira e para a necessidade dos consumidores, que seriam os possíveis tomadores de crédito.

O Brasil tem cerca de 40 milhões de contas bancárias para um número quatro vezes maior de habitantes. Entretanto, o número de pessoas que têm acesso a uma conta bancária e, portanto, ao crédito oferecido pelos bancos, é muito inferior a esses 40 milhões. Há uma exclusão bancária no País bastante acentuada que limita a obtenção de empréstimos. A estrutura bancária também não está preparada para atender ao segmento mais pobre, justamente o que mais precisa de crédito.

Comércio também é excluído

A população de baixa renda está excluída do sistema bancário. Mas tem uma parte importante do mercado, os estabelecimentos comerciais, que também estão fora, de certa forma, do crédito bancário tradicional. Poderíamos dimensionar entre 50% ou até mesmo dois terços dos estabelecimentos que também estão excluídos. As exigências e o custo são tão grandes para se ter conseguir um empréstimo que só nos resta uma conclusão: os bancos têm mais interesse em emprestar volume altos para muitos poucos tomadores do que pequenas quantidades para muitos.

Empresas perdem competitividade

Um dos problemas da baixa competitividade das pequenas empresas no Brasil tem a ver com a dificuldade em conseguirem financiamento. Sem dinheiro para investir na produção, na compra de equipamentos mais modernos e na ampliação de sua estrutura, essas empresas perdem mercado, especialmente o externo. Quem exporta hoje no Brasil são entre 13 e 14 mil pequenas empresas apenas. Crédito de menor valor é mal utilizado Grande parte dos empréstimos de menor valor é feita para a classe média com o objetivo de resolver o problema de dívidas, fechar o déficit do cartão bancário, do cheque especial do que voltado para quem quer começar um negócio, para o mercado produtivo. O valor médio dos empréstimos é acima de R$ 2 mil. Portanto, ainda assim o microcrédito não chega tão fácil ao segmento mais pobre da população, para quem o valor médio dos empréstimos está hoje em R$ 100. Brasil tem pouca experiência em microcrédito Nós, no Brasil, temos uma experiência recente na área de microcrédito. Além do mais, é uma experiência de pouco êxito.

A quantidade de crédito para micro, pequenas e médias empresas que é feita anualmente no País é muito pequena, considerando-se a procura (o investimento federal em microempresas no primeiro semestre de 2002, feito por meio das instituições financeiras, foi de R$ 5,4 bilhões, segundo o relatório Brasil Empreendedor programa do governo responsável pela liberação dos recursos).

O potencial de tomadores de crédito hoje no Brasil é calculado entre 15 e 20 milhões, sejam elas profissionais autônomos, pequenas empresas ou os pequenos negociantes. Mas hoje o País tem menos de 200 mil operações na área de microcrédito. Um número muito pequeno.

Roseli Lopes