Palocci e Dirceu divergem sobre juros
A política econômica mais uma vez pôs em campos opostos os dois principais integrantes do primeiro escalão do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Um dia depois de o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, afirmar que “os juros já cumpriram seu papel” na retomada do crescimento e que agora é necessário priorizar a agenda de reformas microeconômicas, seu colega José Dirceu, chefe da Casa Civil, disse que o país precisa urgentemente de taxas de juros menores. As divergências foram expostas no seminário Agenda para o Desenvolvimento Sustentável da Infra-Estrutura, promovido pela Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), com participação maciça de representantes do governo.
O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e o chefe da Casa Civil, José Dirceu, se desencontraram durante o evento da Abdib. Dirceu falou antes e elogiou a condução da economia pelo colega, mas pediu o relaxamento da política monetária e disse que o país vive situação “esquizofrênica”.
– O país precisa de juros mais baixos. Sabemos também que não temos desvios, atalhos nesse caminho, que tem que ser persistente, de reduzir os juros – afirmou, ressalvando que Palocci tem conduzido a economia brasileira ao porto seguro da estabilidade, chave para a retomada do crescimento, mas ainda assim insuficiente. – O Brasil tem condições para se desenvolver, mas não consegue romper o círculo vicioso de estagnação.
No centro da discórdia, está a taxa básica de juros (Selic), congelada pelo Banco Central em 16% ao ano, devido às “incertezas do cenário externo”. Economistas avaliam que a taxa poderia ser bem mais baixa, sem prejuízo à estabilidade, o que aumenta a pressão sobre a cautelosa condução da política econômica.
Apesar de não presenciar seu discurso, Palocci pareceu responder ao chefe da Casa Civil, pouco depois, ao ressaltar sua importância para o equilíbrio econômico. E fez questão de negar desavenças em relação à economia.
– Não diria que são intrigas. Às vezes, tem gente que gosta de ver as diferenças maiores do que elas são, maiores do que elas aparentam ser – afirmou Palocci.
Outro que aproveitou o evento para criticar a elevada taxa básica foi o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Carlos Lessa. Ele defendeu ainda uma queda agressiva da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP, referência para empréstimos a empresas), hoje em 9,75% ao ano.
Durante o evento da Abdib, os empresários não pouparam críticas ao governo.
Reclamaram da falta de clareza dos marcos regulatórios e da elevada carga tributária. Segundo o empresário da Alstom e vice-presidente da Abdib, José Luiz Alquérez, o governo tem que aprender a gastar melhor os poucos recursos que têm e reabilitar a poupança do setor público.
Palocci e o ministro do Planejamento, Guido Mantega, saíram em defesa do governo e ressaltaram que os investimentos da iniciativa privada são essenciais para a retomada do crescimento. Segundo Palocci, os projetos que tratam da reforma microeconômica e estão aguardando aprovação do Congresso não são fundamentais apenas para o crescimento deste ano e sim para os próximos.
– O crescimento deste ano está praticamente dado. Agora, elas (reformas microeconômicas) são essenciais se queremos que o Brasil cresça por 10 ou 12 anos e não apenas por um ano e espere a próxima crise – afirmou Palocci.
Palocci disse que não é possível contar com as instituições públicas para resolver todos os problemas do país. Se tiver que suprir todas as necessidades, a carga tributária não vai cair e sim ser elevada ainda mais. Se o governo quiser gerar um milhão de empregos por decreto, afirmou, terá que aumentar a carga tributária.
Mantega acrescentou que, como o setor público não tem dinheiro para investir, cabe ao governo estimular os investimentos privados. Uma das maneiras é tornar a aplicação rentável.
Edna Simão