Os empresários brasileiros elegeram dois obstáculos no topo das preocupações que afetam o desenvolvimento econômico e social de seus negócios: a excessiva carga tributária, que esmaga o empreendedorismo, e a corrupção (ativa ou não), que compromete até 3% do faturamento de muitas companhias. Os dados constam da pesquisa “Fraude e corrupção no Brasil: a perspectiva do setor privado em 2003”, divulgada semana passada pela organização não-governamental Transparência Brasil em parceria com a consultoria Kroll.
O pagamento de propinas, para 69% das 78 empresas entrevistadas, abocanha 3% da receita. Essa porcentagem é ainda mais desesperadora para outras 25%, que afirmaram gastar entre 5% e 10% do que movimentam com procedimentos que vão de comissões ilícitas oferecidas a fornecedores até “acertos” efetuados com fiscais públicos. Essas práticas, para 21%, já são comumente aceitas nos níveis de gerência.
“As empresas encaram a corrupção como despesa dentro do mercado em que atuam e erram ao usar a realidade da propina como fator de estratégia empresarial”, analisa Claudio Weber Abramo, secretário-geral da Transparência Brasil. Essa é a segunda pesquisa realizada pela ONG no País. Para Abramo, “os números continuam horrivelmente altos e devem chamar atenção das autoridades e sociedade civil, especialmente neste que é um ano eleitoral”.
Administração pública – Atos de desonestidade praticados por agentes públicos foram denunciados por 53% dos participantes. Um quarto das empresas sofreu assédio para ser facilitada a obtenção de licenças concedidas pelo poder público, e mais da metade declarou já ter sido objeto de achaques por fiscais tributários. Nesse caso, o principal favor oferecido é o relaxamento das obrigações, em 83% dos casos. O tributo eleito como mais vulnerável foi o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), com 78% dos votos, seguido por tributos trabalhistas, 71% dos casos, e o Imposto sobre Serviços (ISS), 68%.
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco), Emerson Kapaz, há uma correlação, ainda que não explicitamente expressa na pesquisa, entre corrupção e elevada carga tributária. “As fraudes poderiam ser evitadas se os impostos no País fossem reduzidos. Estamos criando um estado paralelo, em que mafiosos se especializam em sonegação e corrupção nas empresas”.
Favores e privilégios – O levantamento procurou identificar também quais são os principais métodos usados pelos empresários para obter tratamento diferenciado dos agentes públicos. Oferecer presentes e outras gentilezas é uma prática usada por 86% das empresas. Em segundo lugar, com 77% das lembranças, aparece a contribuição para campanhas eleitorais e, com 74%, o nepotismo. Mais de um quarto das empresas relata ter sido constrangida a contribuir com campanhas eleitorais. Dessas, metade conta que as doações foram feitas mediante promessas de troca de favores. Apenas 29% admitiram praticar ameaças e constrangimentos a agentes públicos para obter vantagens lucrativas.
A participação em licitações públicas foi outro alvo da pesquisa. Metade das empresas já tentou fazer ou faz parte de licitações públicas. Delas, 62% relataram terem sido submetidas a pedidos de propinas relativas a algum aspecto do certame ou do contrato. Mas poucas levaram adiante seu direito de contestação. Apenas 23% entaram com recurso administrativo e 5% solicitaram investigação junto ao Tribunal de Contas e foram à Justiça.
Para Eduardo Sampaio, presidente da Kroll, apesar da pressão sobre os empresários ser grande, eles devem resistir à extorsão em qualquer circunstância. “Não participem do processo de corrupção. Procurem a corregedoria, os tribunais ou a polícia, para não se tornarem reféns de uma situação que não tem fim”.
Tributos – A Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, procurada pela reportagem, informou que a Corregedoria da Coordenadoria da Administração Tributária (Corcat) realiza a fiscalização preventiva dos trabalhos fiscais e faz correições (verificações) nos postos fiscais, com a análise de documentos e de procedimentos.
Segundo o corregedor-chefe, Mário Neto, atualmente estão em andamento na Corcat 34 processos administrativos. Há também em tramitação 21 expedientes de verificações preliminares, abertos principalmente com base em denúncias de contribuintes. “Quando existe algum indício ou suspeita de irregularidade o auto de infração passa por uma auditoria. A Corregedoria apura também denúncias de corrupção ou de irregularidades na fiscalização de tributos.”
Tsuli Narimatsu