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Olhe quem está falando: o perigo da fofoca corporativa

Guarulhos, 01 de abril de 2004

Você viu quem está na sala do chefe? Sabe quanto ela recebeu de aumento? As perguntas podem ser um pouco diferentes, mas a fofoca faz parte de qualquer ambiente de trabalho. Nesse exato momento, deve haver alguém em sua empresa que parou o que estava fazendo e virou para o colega do lado para falar da vida de alguém. Embora possam parecer inofensivos, esses comentários de canto de boca acabam prejudicando a produtividade e o clima nas empresas.

Autor do livro “Tratado Geral sobre a Fofoca”, o psiquiatra José Ângelo Gaiarsa também chama atenção para os efeitos maléficos da fofoca. “É sempre negativa. Geralmente é motivada por inveja e poucos admitem que a praticam, embora seja impossível alguém nunca ter feito”.

Gaiarsa vai além e calcula que pelo menos 40% de todas as conversas do mundo se baseiem em fofocas. “Estimo que 20% de tudo o que se diz no mundo é conversa funcional, ordem, pedido, informação, constatação e declaração. Os restantes 80% se dividem em duas partes iguais: 40% dela é fofoca e 40% é afirmação de preconceito.”

“A fofoca é o grande ladrão de energia em uma empresa”, diz Edmour Saiani, consultor de varejo e diretor da Ponto de Referência, empresa especializada na área. Acostumado a lidar com os problemas cotidianos no ambiente corporativo, Saiani vê a fofoca como desperdício de tempo. “O ser humano é fofoqueiro por natureza. Em uma empresa, isso é prejudicial, pois perde-se tempo que poderia ser investido em descobertas ou resolução de problemas”.

Definição – Qual é a diferença entre fofoca e um simples comentário? Segundo o dicionário Houaiss, fofoca significa um dito maldoso, uma especulação ou informação não baseada em fatos concretos.

Especialista em comportamento organizacional, o psicólogo Moacir Sampaio Silva, que também é professor de psicologia social das Organizações no Instituto Sedes Sapientiae, define fofoca como uma pretensa informação reservada, mas que carrega conteúdo emocional. “O intuito, geralmente, é comprometer a imagem de alguém, defender interesses pessoais ou, simplesmente, manifestar malícia”, explica.

A fofoca nem sempre é planejada. “Muitas vezes ela é inconsciente, visando minar o sucesso dos outros em favor de si mesmo”, afirma o psiquiatra Eduardo Ferreira Santos. Para ele, a falta de solidariedade, a dificuldade de relacionamento e o individualismo são características que podem resultar na prática da fofoca.

Alvo x Atirador – Tentar reduzir a importância do sucesso de alguém é típico de pessoas inseguras, infelizes ou insatisfeitas com a própria trajetória pessoal ou profissional, dizem os especialistas. “Fofoca todo mundo faz mas, quando a pessoal não tem auto-estima, torna-se um instrumento pernicioso”, diz Sampaio. “Quem se sente incapaz de conseguir sucesso tenta destruir os que chegaram lá”, completa. “É um instrumento que demonstra autocensura, autocastração e irrealização pessoal”, explica Gaiarsa.

Por isso, os bem-sucedidos na carreira e no ambiente de trabalho, os que mais se destacam, estão mais sujeitos a virar alvo da maledicência.

Como lidar – Como não é possível acabar com as fofocas no trabalho, existem algumas medidas que podem minimizar seus efeitos negativos.

Quem não quer ser alvo de mentiras deve fazer a sua parte, evitando comentários maldosos sobre os colegas ou mesmo recusando-se a ouví-los.

Os líderes também têm um papel importante na interrupção dessa corrente. Para Saiani, é importante que se proporcione desafios aos funcionários. “O líder competente sabe que, frente a propostas desafiadoras, mais as pessoas vão se preocupar em alcançar a meta, deixando as fofocas de lado”, diz. O consultor ainda ressalta o benefício de uma liderança presente. “Sua atitude forte faz com que todos se mexam. Por isso o líder deve caminhar, agitar e indicar caminhos”.

Além disso, é sempre importante falar bem. “O elogiado terá um estímulo para continuar fazendo sempre o seu melhor e o elogiador manterá uma boa imagem pessoal”, afirma Ferreira Santos. A dica não vale apenas para os líderes. Falar bem dos colegas e elogiar sinceramente contribui para melhorar o clima e, consequentemente, para a boa imagem de quem elogia.

Fatos e boatos – A fofoca nem sempre se ocupa de diminuir o sucesso de alguém. O boato, ou a versão corporativa da fofoca, trata de procurar respostas para mudanças futuras no rumo da empresa. Quando a corporação passa por processos de fusão ou reestruturação, por exemplo, cresce a insegurança e o espaço para especulações, a base dos boatos. “As famosas rádio-corredor ou rádio-peão são tentativas de preencher lacunas deixadas pela falta de informação”, diz Moacir Sampaio.

Como na fofoca, ir a público e negar o boato é um erro. “Corre-se o risco de aumentar sua importância, de divulgar ainda mais a informação incorreta”, explica o psicólogo. Buscar a fonte da boataria também é tarefa insana. O melhor, segundo Sampaio, é que a empresa se empenhe em informar corretamente os funcionários sobre o futuro da companhia para acabar de vez com o telefone sem fio.

André Alves e Fabiana Corrêa