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Oito anos de Real

Há exatos oito anos, a economia brasileira passou por uma revolução: foi lançado o Plano Real que, desde então, domou a inflação. A moeda criada em 1994 resistiu a choques externos, denúncias na área política e à lentidão oficial em resolver problemas estruturais, como a reforma da Previdência. Nesse período, o País colecionou conquistas e desilusões, para comemorar e lamentar.

Sem pensar duas vezes, qualquer especialista na área econômica aponta o controle da inflação como o principal sucesso do Plano Real. “Esse foi o grande mérito do plano. A inflação comia todos os recursos que o Brasil produzia”, afirma o economista Carlos Coradi, consultor da Engenheiros Financeiros e Consultores (EFC).

Com o “dragão da inflação” enjaulado, porém, surge o tema do crescimento econômico, grande frustração do período do real. É evidente para todos os especialistas da área econômica que o País precisa gerar mais riquezas, e melhor distribuídas, sem que isso represente perda de estabilidade. Essa necessidade faz parte do discurso de todos os candidatos à Presidência, com pequenas variáveis na forma como isso seria feito.

A partir de 1994, a economia brasileira cresceu, em média, 2,5% ao ano. Esse índice tem se mostrado insuficiente para impedir a escalada do desemprego e para melhorar a distribuição de renda. “A informalidade cresce e a criminalidade é maior. O que foi feito não é suficiente para garantir a felicidade de um povo”, critica Coradi.

Isso não significa que o País esteja pior do que há oito anos. O governo tem divulgado dados motivadores de redução na mortalidade infantil, melhoria no saneamento básico e de ordenamento das contas públicas. A política fiscal ficou mais austera, boa parte da indústria, da agricultura e do setor de serviços se modernizou e ganhou produtividade.

No outro extremo, porém, o Brasil ainda conta com uma parcela superior a 30 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza. O desemprego vem crescendo e hoje chega a 7,7% da População Economicamente Ativa, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

“A princípio, o fim da inflação deveria reduzir a desigualdade social no Brasil”, comenta o economista Ladislau Dowbor, professor da PUC-SP. É esta expectativa que poderia ser atendida com o crescimento econômico. De acordo com Dowbor, somente uma taxa de crescimento acima de 4% ao ano poderia reverter a tendência de aumento de desemprego e da piora na distribuição de renda.

Uma prévia de como esse fenômeno poderia ocorrer foi degustada pelos brasileiros entre 1994 e 1997. Durante quase três anos a economia brasileira teve um desempenho animador, crescendo a uma média de 4% ao ano. Foi o momento em que o frango foi escolhido como símbolo do Real.

Em 1995, o desemprego chegou ao patamar mais baixo da “era Real”. O Brasil suportou sem grandes sustos uma grave crise no México e manteve o rumo até a crise russa. “O 1º mandato de Fernando Henrique foi uma espécie de época de ouro. Aproveitamos o grande fluxo de capitais externos para sustentar o crescimento”, diz Luiz Rabi, economista-chefe do BicBanco.

Fonte de créditos secou com crises

O fluxo de investimentos estrangeiros no Brasil foi crescente entre 1994 e 2000. Com isso, o governo conseguia uma fonte barata de recursos para fechar as contas externas. O câmbio pouco flexível prejudicava as exportações brasileiras, mas ainda não havia obstáculos para captar dinheiro no exterior. O cenário começou a mudar em 1998, quando a crise na Rússia, que decretou moratória naquele ano, fez com que acendesse a luz amarela para os investidores no Brasil.

No início de 1999, o governo deu início ao projeto de ajustes no real. A âncora cambial deu lugar ao câmbio livre, numa transição bem-sucedida, embora forçada pelo mercado. “Nesse momento a fonte começou a secar e o poder público teve de gerar superávit”, diz Rabi.

Somente com uma série de privatizações e cortes do orçamento o governo conseguiu gerar um superávit capaz de sustentar as contas públicas. O ajuste não foi suficiente para fazer a economia crescer como antes. A média anual de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no período entre 1998 e 2001 é inferior a 2%.

As principais razões para este desempenho são a retração da economia americana e a política de juros altos mantida pelo Banco Central do Brasil.

Os juros elevados faziam parte da estratégia para manter sob controle a inflação, mas criaram dois problemas: a estagnação da economia e a disparada da dívida interna. “Com juros altos há poucos recursos para o setor produtivo. Além disso, não houve uma política industrial eficiente nestes oito anos”, avalia Ladislau Dowbor.

A missão para o próximo governo será a retomada do crescimento num momento em que o mercado aponta que desconfia do País. “O ajuste externo, através do aumento das exportações, e das contas públicas ainda precisam ser feitos”, diz Rabi. Nesse processo, a redução dos juros ganha papel central, pelo menos nas prévias de programas de governo.

GUIDO ORGIS

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