Informalidade: Brasil “virou um Paraguai”
A informalidade na economia adquiriu proporções alarmantes, indica estudo de quase 60 páginas produzido pela consultoria McKinsey a pedido do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco). A informalidade afeta 39,8% do Produto Interno Bruto (PIB), índice que supera em mais de 20% a média de 133 países analisados em recente pesquisa do Banco Mundial; e 50% dos empregos não-rurais do País. No agronegócio a situação é mais dramática, 90% da força de trabalho está na informalidade. As constatações dessa pesquisa reforçam o levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de que 9 milhões de trabalhadores não têm carteira assinada.
Tais indicadores levaram o economista Eduardo Giannetti da Fonseca a situar o Brasil no mesmo grau de “pesadelo” que o Paraguai, com alta incidência do conjunto que compõe a informalidade, como sonegação, evasão e elisão de impostos, e falsificação, pirataria e contrabando de mercadorias. “Em grande medida, o Brasil já virou um grande Paraguai”, comparou Giannetti, após participar do seminário “Brasil Paralelo vs Crescimento Econômico”, realizado em São Paulo, pelo Instituto Etco.
De acordo com o estudo da McKinsey, o conjunto da informalidade afeta mais os setores da construção civil, farmacêutico, varejo alimentício e combustíveis.
Lucratividade – “A sonegação compensa, o crime compensa”, afirmou o presidente do Conselho de Administração do Grupo Pão de Açúcar, Abílio Diniz, ao lembrar que a informalidade brasileira gera uma lucratividade de 300% às companhias, enquanto que, em países como o México, esse ganho não ultrapassa 75%. “Não existe logística ou produtividade capaz de enfrentar o informal”, adicionou, ao informar ainda, com base no documento da McKinsey, que 54% do comércio varejista está na informalidade. “Mas tenho a impressão que é 80%”, queixou-se. Segundo ele, muito dessa irregularidade conta com a complacência da indústria nacional, que aceita o “passeio” de notas fiscais intra-estados, para recolher menos ICMS, apesar de as mercadorias permanecerem dentro dos estados.
Na avaliação do economista José Alexandre Scheinkman, professor da Universidade de Princeton (EUA), a informalidade no Brasil é um problema tão sério, que hoje é 40% superior à verificada em outros países que também enfrentam esse tipo de ilegalidade. “Temos de reconhecer que o nível de informalidade no Brasil é muito alto, mas também precisamos reconhecer que as pessoas, sobretudo as de baixa renda e mais inseridas na informalidade, não têm confiança no Estado”, analisou, indicando que existe um “aspecto cultural” nesse problema e que qualquer reforma tributária futura terá de ser observada sob à ótica da informalidade. “Essa é uma questão importante, senão o Brasil não vai progredir.”
“A informalidade está concentrada em trabalhadores de baixa renda e que têm até o quarto ano de escolaridade somente, e trabalham em empresas de até R$ 4 mil de faturamento mensal”, admitiu o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Marcos Lisboa. Para ele, as falhas do mercado de trabalho induzem à informalidade, algo que por sua vez, compromete o crescimento econômico do País.
Carga tributária – O resultado dos debates do seminário indicou que redução da carga tributária brasileira, hoje situada em torno de 38% do PIB, constitui elemento primordial para que o País possa atenuar o problema da informalidade. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), relatou a experiência vivida no Estado com a redução, no início desse ano, do ICMS do álcool combustível de 25% para 12%. “A arrecadação aumentou 7% após adotarmos essa medida”, informou.
Lisboa, por sua vez, minimizou os resultados obtidos por São Paulo. Segundo ele, a experiência paulista é “uma raríssima exceção”, não podendo ser estendida ao restante do País e demais cadeias produtivas.
Na contramão, o secretário do Ministério da Fazenda, o ex-secretário da Receita Everardo Maciel recomendou, entre outras ações, um sistema de simplificação dos impostos, complementados com a redução de alíquotas. Especificamente sobre ICMS, Maciel sugeriu a adoção de, no máximo, três alíquotas. “O ponto central deve ser a simplificação tributária e de forma gradual, para acompanharmos os impactos de cada mudança feita”, sugeriu.
Encargos trabalhistas – Giannetti da Fonseca, por sua vez, ponderou que a informalidade não será resolvida apenas com base em fiscalização e punição, mas com redução da carga tributária, principalmente na área trabalhista. Ele lembrou que, em 2001, o INSS arrecadou R$ 62,5 bilhões e gastou R$ 75,3 bilhões, dos quais R$ 28,7 bilhões “não tinham nada a ver com a Previdência, mas serviram apenas para fazer assistência social”. “Não é a forma mais inteligente cobrar do trabalho formal o pagamento dessa assistência social.”
O economista explicou que pagamentos como a aposentadoria de trabalhadores rurais e urbanos, que nunca contribuíram com a Previdência, não deveriam contar com recursos da contribuição dos trabalhadores formais, mas sim de uma outra fonte. “Se retirarmos essa contribuição, podemos reduzir a alíquota sobre folha de pagamento de 20% para 14%, o que permitirá atrair trabalhadores para a formalidade.”
O Instituto Etco também sugere que o Brasil adote modelos de experiências vitoriosas no combate à informalidade, como os aplicados na Espanha, onde o emprego formal saltou de 47% da População Economicamente Ativa, em 1994, para 60%, em 2002. Outro item essencial , afirma o instituto, será a simplificação dos procedimentos para a abertura, manutenção e fechamento de empresas.