Com um cenário de vendas em retração, renda estagnada e estoques maiores que a média, sem perspectiva de solução no curto prazo, as empresas estão deixando os investimentos produtivos para depois. Apenas 30% da indústria brasileira manifesta disposição de aumentar a capacidade de produção este ano, conforme recente levantamento de intenção de investimento da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Para Aloísio Campelo, responsável pela pesquisa, esta situação é preocupante, pois a retomada do crescimento sustentado da economia vai exigir novas plantas, principalmente em setores que chegaram à beira da exaustão da capacidade instalada, como é o caso de borracha, metalurgia e papel e celulose. Até agora, apenas os setores exportadores estão respondendo a essa necessidade.
Nesta terça-feira (08/07), a FGV deve divulgar uma amostragem prévia da Sondagem de julho. Campelo nada quis adiantar sobre a nova pesquisa, mas não esconde o fato de que os novos dados deverão reafirmar um cenário de recuperação econômica será lenta e gradual em 2003. A mudança do quadro econômico, já anunciado pelo governo, com queda lenta dos juros e aumento da oferta de crédito e aprovação das reformas poderá propiciar a retomada dos investimentos em algum momento, mas este ano, este movimento não será muito forte, avalia. A seu ver, enquanto no primeiro semestre o alvo das preocupações da indústria era a inflação, agora no segundo semestre, serão as reformas.
Avalia que a capacidade instalada da indústria está muito ligada, num determinado momento econômico, a questão dos estoques. Na última pesquisa da Sondagem industrial, da FGV, dentre as categorias de uso, o de bens de capital apresentava estoque excessivo. E, dos 40 ramos industriais pesquisados, a metade informava também estar com estoques excessivos. A maioria era formada por indústrias ligadas ao mercado doméstico, como é o caso de produtos metalúrgicos para construção, aparelhos elétricos para uso doméstico e pessoal (eletroeletrônico), material de transporte, com destaque para caminhões e ônibus, produtos farmacêuticos, produtos de matérias plásticas, vestuário, calçados e alimentos, dentre outros.
Estes ramos industriais apresentavam também alto nível de ociosidade, como produtos metalúrgicos para construção e material eletrônico, que estavam em abril com uma capacidade ociosa de 30%. Equipamentos para telecomunicações apresentava uma taxa de ociosidade ainda maior, de 45,4%, percentual que chegava a 31,3% nas fábricas de televisores, rádio e toca-discos. O grande gargalo desses setores ainda é falta de demanda.
Campelo chama a atenção para o fato de que os setores exportadores, como papel e celulose, estão correndo no sentido inverso desses ramos industriais, pois têm mercado garantido lá fora. Eles estão com elevado nível de capacidade instalada por conta dessa situação favorável no mercado internacional, enquanto o mercado interno está parado, destacou.
O setor de papel e celulose é o maior exemplo de sucesso nesses tempos de juro alto e queda de renda do consumidor. A Sondagem da FGV revela que as fábricas de celulose estão operando com 100% de capacidade instalada, pois conseguem vender quase 90% da sua produção.
Para Marcelo Nardin, chefe do Departamento de Orçamento do BNDES, setores exportadores, como papel e celulose, siderurgia e de petróleo, estão à frente da retomada. “Os sinais de recuperação dados pelo governo – queda do juro, aumento do crédito e declínio da inflação – estão levando grandes empresas a desengavetar projetos , o que ainda não está acontecendo com as médias empresas.”
O receio de Campelo e Nardin é que o recente comportamento do dólar comprometa o bom desempenho das exportações e trave os projetos.
Nesse cenário, como avalia Salomão Quadros, coordenador de análises econômicas da FGV, a volta do crescimento se dará pelo preenchimento da capacidade ociosa, hoje em média de 29% da indústria. “Crescimento sustentado é ampliação permanente da capacidade, é o fim do stop and go”.