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Dólar abaixo de R$ 2,40 preocupa setores do governo

Guarulhos, 06 de dezembro de 2001

Fonte: VALDO CRUZ – Diretor-Executivo da Folha de S.Paulo, em Brasília e SÍLVIA MUGNATTO da Folha de S.Paulo, em Brasília

A valorização do real já preocupa setores do governo. Comemorada inicialmente, a queda no valor do dólar já está levando gente dentro do governo a defender uma cotação mínima de R$ 2,40 para a moeda norte-americana.

Para esses setores, o Banco Central deveria inclusive comprar dólares caso ocorra uma queda excessiva da cotação, algo abaixo dos R$ 2,40. Ontem, o dólar fechou o dia cotado a R$ 2,437.

Uma valorização acentuada do real poderia reduzir o ritmo de recuperação dos superávits na balança comercial, considerados essenciais para a redução da vulnerabilidade externa brasileira.

Com o dólar na casa dos R$ 2,45, o governo aposta num superávit da balança entre US$ 6 bilhões e US$ 7 bilhões em 2002, o ano da sucessão presidencial. Atacar aquele que é considerado o principal entrave para o crescimento do país -a sua dependência excessiva de capital externo- seria um trunfo na campanha tucana.

O sistema cambial brasileiro hoje é o da flutuação suja, no qual o preço do dólar varia de acordo com o mercado. O BC, porém, atua comprando ou vendendo quando enxerga movimentos bruscos da taxa tanto para cima como para baixo.

Depois dos atentados nos Estados Unidos, o dólar subiu e atingiu R$ 2,84. A média das taxas dos títulos vendidos pelo Tesouro no período foi de R$ 2,74.

A disparada do dólar levou o BC a vender títulos indexados à correção cambial e a fazer pequenas intervenções no mercado, vendendo US$ 50 milhões por dia para dar mais liquidez aos negócios.

Essa estratégia só foi abandonada com os atentados ocorridos em 11 de setembro. Entre os dias 11 e 13 de setembro, o BC vendeu US$ 370 milhões no mercado. Desde os ataques terroristas, já foram vendidos US$ 3,17 bilhões.

Como as medidas não estavam surtindo o efeito esperado, o governo também reduziu o poder de compra de dólar por parte dos bancos, o que acabou ajudando a conter a alta. A queda na taxa de câmbio se acentuou após o anúncio do pacote argentino que definiu o formato da reestruturação da dívida naquele país.

Naquele momento, o mercado financeiro passou a avaliar as economias brasileira e argentina de maneira diferenciada. É o que tanto o mercado como o governo estão chamando de “descolamento” do Brasil da Argentina.

Também contribuiu para a queda do dólar o bom desempenho da balança comercial neste ano, que já acumula superávit de US$ 1,7 bilhão. Curiosamente, parte desse resultado foi devido à alta do dólar, que elevou as exportações e reduziu as importações.

A última compra de dólares feita para impedir a queda da moeda americana foi em novembro de 2000, quando o Santander trouxe cerca de US$ 2 bilhões para completar o pagamento da compra do Banespa. Na época, a cotação havia caído de R$ 1,97 para R$ 1,89.

A Folha apurou que a situação da Argentina não é um fator de preocupação adicional no governo, mas existem opiniões favoráveis à flutuação do peso. A flutuação, segundo esses técnicos, deveria seguir o modelo defendido pelo ex-economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento, Ricardo Hausmann.

O economista sugeriu a conversão das dívidas em pesos e a sua correção pela inflação. Ou seja, os credores teriam alguma proteção futura. Em seguida, o governo argentino adotaria a flutuação cambial, acabando com a paridade entre dólar e peso.