Crediário pode ser pago com dinheiro
A Receita Federal esclareceu, por meio de nota, que as operações de crédito direto ao consumidor poderão continuar a ser pagas com dinheiro, acabando com uma polêmica que envolvia a Lei nº 10.892/04, que trata da isenção de Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) para as contas-investimento.
O problema estava no inciso II do artigo 16 da lei. O texto diz que “a liquidação das operações de crédito será efetivada somente por meio de lançamento a débito em conta corrente de depósito do titular ou do mutuário, por cheque de sua emissão, cruzado e intransferível, ou por outro instrumento de pagamento (…)”. A interpretação literal do inciso levou alguns especialistas a levantar a tese de que o consumidor não poderia mais pagar seu carnê ou fatura com dinheiro. Isso seria uma forma de forçá-lo a abrir conta corrente e gerar CPMF, compensando as perdas com a conta-investimento.
O advogado Eduardo Pugliesi Pincelli, do escritório Barros Carvalho Advogados, foi um dos que levantou a polêmica, dizendo que a restrição ao uso de dinheiro é inconstitucional. Para ele, ao citar operações de crédito, o governo estaria incluindo o crediário.
Porém, a Receita esclareceu que, relativamente às operações de crédito, “não houve qualquer alteração nessa nova lei, posto que a obrigatoriedade de trânsito em conta corrente de depósito na concessão e na liquidação já constava do texto legal anterior” – a Portaria nº 227/2002 -, que dispensa o financiamento de bens e serviços – inclusive nas operações de crédito direto ao consumidor – da obrigação.
De acordo com a nota da Receita, o Ministério da Fazenda vai, inclusive, reeditar a portaria que regulamentou a cobrança da CPMF. No texto vai reafirmar o entendimento de que não haverá mudanças na forma de pagamento das prestações de crediário. E ampliar a lista das operações que estão dispensadas da obrigação, incluindo o crédito consignado em folha de pagamento e o empréstimo às pessoas de baixa renda.
A lei provocou várias críticas no Congresso. O presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), informou que o partido iria contestar na Justiça a lei. Segundo ele, tratava-se de uma medida “flagrantemente ilegal”, pois na prática impediria o uso da moeda corrente no País. “É uma agressão aos direitos dos cidadãos.”
Segundo o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), Gilberto Luiz do Amaral, a medida seria uma maneira de incrementar a arrecadação da CPMF, que será reduzida em R$ 300 milhões no último trimestre de 2004 por causa da entrada em vigor da conta-investimento. A expectativa do IBPT é de que em 2004 o governo arrecade R$ 26,15 bilhões de CPMF, contra os R$ 23,4 bilhões de 2003.
Mas ele, assim como outros advogados e economistas ouvidos pelo Diário do Comércio , entende que a lei foi mal interpretada por alguns especialistas e que proibir o consumidor de pagar seu crediário com dinheiro seria absurdo. “A loja não faz operação de crédito. Faz venda financiada. Seria um absurdo impedir o acesso ao crédito para a população que não tem conta bancária”, afirmou o economista Marcel Solimeo, do Instituto de Economia Gastão Vidigal da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
“Pelo artigo não dá para concluir que há restrição ao uso de moeda”, diz o advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marcos Diegues. “Ninguém pode deixar de aceitar pagamentos em dinheiro.”
Adriana David