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Carandiru finalmente chega às telas

Transpor um livro para as telas já não é uma tarefa lá muito fácil. O diretor Fernando Meirelles, por exemplo, levou quase um ano para adaptar o épico Cidade de Deus, do escritor Paulo Lins. Quando o livro é um best-seller, então, a responsabilidade é muito maior. É o caso do aguardado Carandiru – O Filme, longa de Hector Babenco inspirado no livro Estação Carandiru, de Dráuzio Varella. Na obra, o médico conta as histórias ouvidas e vividas durante os doze anos em que cuidou dos doentes do maior presídio da América Latina, que encerrou suas atividades no ano passado.

O resultado é um filme bastante complexo. Primeiro, pela quantidade de personagens: o elenco tem mais de 150 atores. Não há um papel principal, nem mesmo o de Varella (interpretado por Luiz Carlos Vasconcelos), que só pontua a narrativa do longa. Babenco apenas destaca os relatos mais impressionantes de como alguns presos foram parar no inferno de concreto. Por algumas vezes, essa costura de histórias pode confundir o espectador. Mas isso não compromete o clima tenso que envolve as quase três horas de duração do filme.

Outro bom aspecto de Carandiru é o leque de boas atuações, vindas desde veteranos até novatos. Milton Gonçalves, por exemplo, vive o momento mais emocionante do filme. O ator interpreta um detento que, depois de décadas atrás das grades, está prestes a ter sua liberdade de volta. O galã Rodrigo Santoro, por sua vez, convence como o travesti apaixonado Lady Di. Já o sempre ótimo Wagner Moura despe-se de seu sotaque naturalmente soteropolitano e encarna um verdadeiro “mano” da periferia de São Paulo.

O grande desafio de Babenco, porém, ficou para o fim: traduzir em imagens o massacre de 1992, quando 111 presos morreram durante a invasão da Polícia Militar para conter uma rebelião. O diretor acerta ao manter o tom parcial adotado no livro Varella, que ouviu apenas os relatos dos detentos sobre a tragédia. Aí está o ponto mais alto do filme. Babenco não poupa o público de cenas chocantes – e retorna ao cinema de denúncia social que marcou o início de sua carreira, com filmes como Pixote.

Depois de uma década, esta é a primeira vez que o massacre de 92 é retratado na ficção. O mais importante, porém, é que não sejam necessários mais dez anos para que cada vez mais brasileiros conheçam de perto o episódio – que se encaixa perfeitamente na categoria de uma das maiores vergonhas nacionais.

Andréia Fernandes

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