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Alckmin abandona o ataque e enfrenta Lula irônico

Guarulhos, 20 de outubro de 2006

A estratégia ´Mike Tyson´ foi abandonada por Alckmin, mas tucano não deixou críticas ao governo de lado

Depois do nervosismo do primeiro debate transmitido pela TV Bandeirantes, logo após o primeiro turno, e seguido pela ampla vantagem que as pesquisas de intenção de votos para a Presidência da República indicam a favor do presidente e candidato à reeleição Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o debate da noite desta quinta-feira, transmitido pelo SBT e mediado pela jornalista Ana Paula Padrão, foi mais tranqüilo e apresentou, de um lado, um Lula mais calmo e irônico e, do outro lado, um Alckmin menos agressivo.

Prova de que as coisas estavam realmente mais frias entre os candidatos é que, desta vez, houve pelo menos cordialidade na hora de os candidatos se cumprimentarem. Os dois únicos momentos de descontração entre os dois opositores no debate ocorreram na chegada ao estúdio e na saída. Antes de tomarem seus lugares, Lula e Alckmin se cumprimentaram cordialmente. Quem tomou a iniciativa foi o presidente. Ao final, quando se preparavam para sair, a apresentadora Ana Paula Padrão quebrou o clima de tensão ao pedir para que posassem para uma fotografia ao lado dela. Dessa vez foi Alckmin quem brincou com Lula.

O presidente candidato aproveitou quase todos os espaços que teve para colar a imagem de Alckmin na do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, também do PSDB e mal avaliado entre o eleitorado. O Lula do debate desta noite não lembra nem de longe o Lula do debate da TV Bandeirantes. O desta noite esteve mais irônico, debochado, atento às oportunidades de atacar seu adversário e, a quase todo momento, falando para o seu eleitor, embora tenha começado o debate mais apático, sem segurança e se apoiando em anotações.

No outro lado do ringue, Alckmin também abandonou o estilo ´Mike Tyson´, adotado no debate da TV Bandeirantes, e partiu para críticas duras, porém mais contidas, tentando colar a imagem de Lula a dados negativos de seu governo e, em especial, sobre a área de saúde. “Eu quero falar com você que está em casa, você sabe que a saúde vai muito mal. Nós retrocedemos, os genéricos foram abandonados, a qualidade do atendimento do SUS não está boa”. Esta foi uma das primeiras vezes em que Lula se apoiou na ironia e parece ter gostado, pois a utilizou até o fim de debate. “A saúde pública não está boa para o Alckmin porque ele não usa. Ele usa convênio médico”, respondeu o petista.

Depois dessa resposta irônica, Lula engatou em outras tiradas, como quando perguntou sobre segurança pública: “Pelo amor de Deus, que o povo de São Paulo não ouça porque vão pensar que vai ter um PCC no Brasil inteiro”, brincou. Outra estocada bem aplicada por Lula em Alckmim foi quando o presidente chamou-o de “colonizado” e de acreditar em tudo que sai no The New York Times.

FHC e privatizações – Depois de admitir, na tarde desta quinta-feira, que sua campanha errou ao supervalorizar o debate sobre as eventuais privatizações que faria se fosse eleito, Geraldo Alckmin teve de conviver com questões sobre privatizações e sobre o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. “Essa pauta da privatização acabou sendo supervalorizada, uma coisa que não existe, no fundo, pela nossa indignação frente a esse conjunto de mentiras, que está sendo colocado e que não tem a menor procedência”, disse Alckmin.

Até mesmo nas considerações finais, Lula manteve a estratégia de dizer que Alckmin era ´mais do mesmo´. Ao se despedir do público, Lula lembrou que “de um lado temos um candidato que depois de governar o País por oito anos e o estado por 12 anos, diz muitas coisas que não fez no Estado e que promete fazer no País. Alguns números fluem na boca de alguns com muita facilidade e cada um pode falar o número que quiser. O dado concreto é que o passado condena alguns, absolve outros, e a prática política pode fazer vocês entenderem melhor. Só peço a Deus que no dia 29 o povo reflita e vote naquilo que ele está vendo no Brasil”, finalizou.

Em tom mais ameno, Alckmin manteve o discurso de que “o PT teve a sua oportunidade”. Alckmin aproveitou a oportunidade de ser o último a falar e atacou a corrupção no governo petista. “O que nós vimos? Sob o ponto de vista ético, um descalabro. Sob o ponto de vista de gestão, um governo que não funciona e sob o ponto de vista de crescimento, o Brasil perdeu oportunidade, deixou passar uma grande oportunidade. Eu quero dizer do que não vou fazer: não vou permitir nas empresas estatais a privatização para partido político como o PT fez. O Brasil tá com a receita errada. Nós vamos trabalhar para pôr a receita certa”, encerrou Alckmin.

Nos bastidores do debate – A apresentadora Ana Paula Padrão admitiu ao final do debate que ficou nervosa no início do debate. Mas depois se acalmou: “No conjunto foi bem mais tranquilo do que eu imaginava.”

A vantagem de 20 pontos que o presidente mantém nas pesquisas ficou refletida na platéia. No estúdio, no lado petista, em vez dos dez ministros que apareceram no primeiro turno, compareceram sete. O vice-presidente, José Alencar, que tinha ido à Bandeirantes, não apareceu. Entre os ilustres desfilava o deputado Luiz Eduardo Greenhalg, de São Paulo, que não conseguiu votos suficientes para se reeleger.

Na platéia, petistas e tucanos mal se falaram nos intervalos do debate. Acusado de representar o papel de advogado de Lula em vez de atuar como ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos procurou o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio, que é quem o acusa com mais veemência, para uma sessão de queijos e vinhos. O encontro ficou marcado para a próxima quarta-feira, em Brasília.

As cinco cadeiras reservadas para os assesores mais próximos dos debatedores foram ocupadas da seguinte maneira: do lado tucano estavam quatro marqueteiros, liderados por Luiz Gonzalez e Woile Guimarães, além do advogado Ricardo Penteado; no campo petista ficaram a ministra Dilma Roussef, ladeada por Clara Ant, o marqueteiro João Santana, o coordenador de campanha e presidente do PT Marco Aurelio Garcia e uma integrante do staff estrelado.

Geraldo Alckmin chegou ao estúdio do SBT com uma gravata vermelha. Prestes a iniciar o debate, foi cumprimentar o governador eleito José Serra, que usava gravata da mesma cor. Alckmin elogiou o acessório, o que causou uma reação inesperada: Serra tirou a gravata e ofereceu ao presidenciável. Ato imediato, Alckmin vestiu o presente. Ao final do debate, o candidato foi devolver o que achava até ali que fosse um empréstimo. Foi mais uma vez surpreendido, com a reação do governador eleito: “Fique com ela. É um presente.”