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A hora e a vez do comércio atacadista

Guarulhos, 03 de maio de 2004

Longe das más notícias que marcaram a vida dos brasileiros durante todo o ano passado, como a queda de 12,2% na renda do trabalhador e o alto índice de desemprego (que chegou aos 12,6%), os atacadistas obtiveram uma performance de causar inveja: crescimento real de 5,4% no acumulado do ano. Juntas, as 5 mil empresas do setor compraram e revenderam ao pequeno varejo mais da metade de todos os produtos de higiene, limpeza e alimentos consumidos no País. Sua participação na cadeia de abastecimento saltou da casa dos 45,6%, em 2002, para 51,1% no final de 2003.

O desempenho reflete a preferência do consumidor pelas lojas de vizinhança. “É a invasão das formigas”, define o consultor de varejo Mário D´Almeida, da Self Service Stores & Suppliers. “Basta observar as pequenas perfumarias, lojinhas de doces e mercadinhos que se espalharam pelos bairros”, completa.

De fato, o segmento foi o único nos últimos três anos que viu sua fatia aumentar no comércio de produtos alimentícios, passando de 35,9%, em 2001, para 38,3%, em 2003. Já os hiper e grandes supermercados, por sua vez, assistiram a redução de sua presença de 18,8% para 16,2% no mesmo período.

Pequenos notáveis – Dados da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) também comprovam a ascensão dos pequenos notáveis. Pelo segundo ano consecutivo eles registraram desempenho acima dos médios e grandes empreendimentos. O setor supermercadista como um todo amargou uma queda real de 4,7% em 2003. As maiores empresas sofreram retração de 3,9%, as médias, queda de 2,9%, mas os nanicos cresceram 0,4%.

Em um ano difícil para a economia como um todo, quando, segundo a AC/Nielsen, 87% dos brasileiros foram obrigados a mudar a lista de compras, 63% migraram para marcas mais baratas e 47% diminuíram a quantidade dos itens adquiridos, o aumento de participação do pequeno varejo chama ainda mais atenção.

Para o diretor-geral da empresa de pesquisas, Arthur Bernardo Neto, mesmo com um mix menor de produtos, essas lojas já apresentam preços mais atraentes quando comparados ao leque de opções dos hipermercados. “O consumidor hoje faz comparação de preços o tempo todo e compra o que vê de oferta ao longo do mês”, diz.

Dependência mútua – Paulo Penacchi, presidente da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores (ABAD), garante que todo o esforço da indústria e atacado caminham no sentido de oferecer variedade e preço bom. “Quanto mais crescer o pequeno, mais o setor cresce junto.”

Graças à parceria firmada com os fabricantes, os atacadistas hoje conseguem fornecer milhares de produtos a preços extremamente competitivos – e em unidades – para dar ao pequenos mais variedade nas marcas oferecidas em seus estabelecimentos e a chance de conquistar uma parcela maior no tíquete de compra do consumidor. “É uma exigência de mercado”, afirma Penacchi. O atacadista, segundo ele, é ainda o principal financiador dos que não têm crédito. “Flexibilizamos prazos de pagamento e às vezes até colocamos produtos em consignação.”

Kênia Santos, sócia-diretora da consultoria de varejo Gouvêa de Souza MD, lembra que “se o atacadista deixar o pequeno e médio ser eliminado, perderá o seu ganha-pão”. Não é à toa que a ABAD e os gigantes do setor, como Martins e Peixoto, criaram suas próprias universidades de varejo, com o objetivo de dar consultoria financeira e de marketing aos empreendedores.

Equilíbrio – Para as indústrias, o fortalecimento dos nanicos é uma forma de manter o equilíbrio na cadeia de abastecimento. “A guerra de preços com as grandes redes, os gastos com promotores e espaço nas gôndolas está se tornando insustentável, principalmente depois de fusões e aquisições entre os supermercados nos últimos anos”, diz uma fonte do setor. “Por isso, a aliança com o atacado nada mais é do que uma estratégia para garantir a manutenção das margens de lucro dos fabricantes.”

Aos poucos, o pequeno varejo de vizinhança, que congrega aproximadamente 900 mil pontos de venda no Brasil, vai se tornando mais capacitado e modernizado, o que inclui bares, padarias, restaurantes, perfumarias, mercados e mercearias. E a previsão é de que o fenômeno não pare de crescer, ao menos este ano. As estimativas são de que o comércio atacadista conquiste uma expansão de 5% em 2004.

Tsuli Narimatsu