Renda muda consumo de não-duráveis
As fortes quedas nos rendimentos do trabalhador mudaram a característica do consumo de bens não-duráveis. Por serem considerados artigos de primeira necessidade, estes produtos não estão perdendo em volume de produção mas sim no valor de venda.
No setor de alimentos, o que ocorre em grande medida é a migração de marcas mais conhecidas, e mais caras, para as mais baratas e desconhecidas, observa o presidente da Associação Paulista de Supermercados (APAS), Sussumo Honda. O resultado disso se dá sobre o faturamento, que no primeiro trimestre, descontando-se as novas lojas, teve uma queda de 9% . Honda afirma que “um empate” no faturamento este ano já seria bom. “Talvez o aumento do salário mínimo e abertura de novas lojas ajudem a deter esta queda”, avalia.
O segmento de cosméticos e produtos de higiene pessoal está conseguindo manter as vendas estáveis, mas está alerta para o problema de renda.
Mesmo neste cenário, a Associação Brasileira da Indústria Alimentícia (ABIA) está prevendo um crescimento de até 3,5% na produção do setor. No primeiro trimestre, o crescimento no volume foi de 3,9%. Além da influência das exportações, que representam 25% dos negócios do setor, o desempenho dos segmentos de carne, café e açúcar no mercado interno também contribuiu. Por outro lado, bebidas, óleos e gorduras, biscoitos, pães e bolos não estão indo bem.
Para o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Salvador Nogueira, o atual quadro de rendimentos está mudando mais intensamente o perfil de consumo da classe média, onde o comprometimento com o consumo de bens não-duráveis é menor. Neste caso, cai a compra dos produtos chamados “supérfluos'. Já entre os consumidores de baixa renda, cuja relação de salário e consumo de não-duravéis é bem maior, não há espaço para grandes reduções. “A venda de alimentos não cai muito entre os mais pobres, mas eles são os primeiros a reagir a qualquer ganho real”, analisa Werneck.
De acordo com o IBGE, o grupo de trabalhadores com carteira assinada perdeu em abril 8% de seu poder aquisitivo. A mão de obra com carteira representa 50% do total. A queda nos rendimentos tem sido mais acentuada, nos 20% de trabalhadores autônomos, 19,6%, na comparação de abril com o mesmo mês do ano passado. Na média, a perda dos rendimentos foi de cerca de 7%.
O diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Sérgio Mendonça, não vê chance de recuperação de renda neste ano. Para que isso ocorra seria necessário antes a retomada da atividade econômica e, conseqüentemente, do emprego. Mesmo com o arrefecimento da inflação, as futuras negociações não tendem a garantir aumentos reais. “A recuperação de renda é o último elo da cadeia”, completa Mendonça.