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Desempregado Off Line

Guarulhos, 10 de setembro de 2007

O desconhecimento da informática está criando um novo tipo de cidadão: o desempregado digital. Hoje, não ter acesso à internet significa ficar fora de uma série de oportunidades de recolocação profissional

Uma pesquisa divulgada pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br) mostrou que, em 2006, 54% dos brasileiros a partir de dez anos de idade nunca haviam utilizado um computador, e pouco mais de 19% tinham o equipamento na própria residência. Mesmo assim, executivos de Recursos Humanos são unânimes em afirmar que esse é um processo que não tem volta.

Johnson & Johnson, Avon, General Motors, Carrefour e Votorantim são apenas alguns exemplos de empresas que não recebem mais currículo da forma convencional. Nem adianta bater na porta delas com o resumo das habilidades em papel. “Há dois anos, apenas empresas que ofereciam cargos mais sofisticados utilizavam a ferramenta. Agora, aquelas em busca de empregados para cargos operacionais também já utilizam o recrutamento online”, diz Cezar Antonio Tegon, diretor-presidente da Elancers, empresa que desenvolve sistemas de seleção através da web. Ele cita como exemplo o Grupo Itavema, que procura até mecânicos e funileiros dessa maneira.

Rapidez no processo é o principal argumento para a disseminação da ferramenta. “Pode-se dizer que, assim, se reduz em pelo menos 50% o tempo de seleção”, afirma Tegon. “Antigamente, o RH era um armazém de currículos, cuja análise demandava muito tempo”, complementa Marcelo Abrileri, presidente da Curriculum.com.br, site de recrutamento e recolocação online, que de janeiro a agosto teve 100.519 usuários empregados.

A Gelre, pioneira na contratação de mão-de-obra temporária no Brasil, embora desde o início deste ano tenha iniciado o recrutamento através de seu site, prioriza currículos no papel. “O profissional pode não ter competência de informática, mas ter o perfil que necessitamos”, diz Gerusa Torquato Mengarda, gerente de Operações da empresa.

Medo do novo – Para Neli Barboza, gerente de consultoria da Manager, além da barreira digital, muita gente ainda resiste em colocar dados nos sites e faz questão de entregá-los pessoalmente. “Essas pessoas precisam se abrir ao novo, e as que ainda não têm acesso, buscar as alternativas”, afirma.

Além de lan houses e cyber cafés espalhados pelos bairros, que cobram em média R$ 2 por meia hora de acesso à internet, o Acessa SP, projeto de inclusão digital do governo estadual, é outra opção. Com a vantagem de ser gratuito. Entre os que utilizaram o serviço no ano passado, 36,6% queriam buscar emprego ou enviar currículos.

A Secretaria de Emprego e Relações de Trabalho, chefiada por Guilherme Afif Domingos, tem programas de pré-qualificação do jovem. “Ele precisa ser preparado para o mercado de trabalho, com noções como computação” diz o secretário.

Um dos beneficiados com o Acessa SP é Roberto Teixeira Gomes, 44 anos, oficial de manutenção com segundo grau incompleto. Morador de albergue desde 2005, ele se cansou de fazer bicos e bater perna entregando currículo sem sucesso. Fez um curso de inclusão digital no albergue Arsenal da Esperança, oferecido em parceria com a universidade Anhembi Morumbi. Desde então freqüenta as salas do Acessa SP para buscar emprego pela internet. Foi quando as “janelas” se abriram e os retornos apareceram. Optou pela primeira oferta: um trabalho temporário que durou 45 dias.

Em seguida, conseguiu agendar três entrevistas de emprego. “É mais fácil para conseguir uma colocação, e também uma forma de melhorar a auto-estima. Já que nós, moradores de albergues, temos dificuldade quando enfrentamos essa situação.”

A enfermeira Maria Ísis de Oliveira, de 49 anos, também conseguiu uma recolocação quando usou o meio online. Registrou o currículo no site da Escola Frei Galvão, que a contratou para ministrar aulas para o curso de técnico de enfermagem. Agora, empregada, ela usa a internet para estudar. No Acessa SP do Parque da Juventude, teve contato com os artigos do psicanalista Jacques Lacan, para se preparar para a pós-graduação que pretende iniciar em outubro.