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Sua Excelência, o consumidor

Guarulhos, 15 de março de 2005

Hoje, Dia do Consumidor, o brasileiro não tem muito a comemorar. Apesar de ser o motor da economia e responder por 56,7% do Produto Interno Bruto (PIB) do País, o consumo das famílias está cada vez mais comprometido com gastos fixos, sem margens para os considerados supérfluos, como lazer.

De acordo com a última pesquisa de orçamentos familiares (POF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 74,69% da renda dos trabalhadores é destinada ao pagamento de produtos e serviços ligados a habitação (35,50%), alimentação (20,75%) e transporte (18,44%).

Obviamente, a situação muda conforme a renda do trabalhador. Quanto maior o salário, menor o percentual destinado a esses serviços. Entretanto, pode-se notar que sobra pouco para o cidadão médio gastar com compras menos importantes para a sobrevivência.

Com os 25,31% do salário restante é preciso pagar despesas ligadas à educação, saúde e higiene pessoal, vestuário e lazer. “Isso mostra o que o povo é obrigado a fazer, mas não o que gostaria”, afirma o professor Cláudio Felisoni de Ângelo, coordenador geral do Programa de Administração de Varejo (Provar) da Fundação Instituto de Administração (FIA) da USP.

Querer não é poder – Segundo o professor, a prova de que o desejo do consumidor é outro vem de uma pesquisa trimestral realizada pelo próprio Provar, que verifica a intenção de gastos com bens duráveis (de alto valor) para os próximos três meses. “A intenção sempre é maior que o resultado concreto de venda dos setores. Isto porque as pessoas desejam, mas quando fazem as contas, descobrem que não podem adquirir determinado item”, explica.

Segundo a última pesquisa da entidade, que mostra a intenção de compra para o trimestre de janeiro a março, 59,20% dos 500 consumidores ouvidos gostariam de adquirir novos bens duráveis. Entre os principais desejos, 12,80% pensava em adquirir algo da linha branca. “As vendas nunca aumentam 50%. Isto quer dizer que a intenção é diferente do fato”, diz Felisoni.

Melhora – No entanto, o poder de compra do brasileiro já esteve pior. Há 30 anos, as despesas de consumo, que somam alimentação, transporte e habitação, mas também outros quesitos como vestuário, fumo e higiene, aumentaram de 74% para 82,41%. Segundo a técnica da POF do IBGE, Márcia Quintslr, isso mostra que o consumidor conseguiu remanejar os gastos. “As prioridades mudam com o tempo. Um exemplo é o fumo. Na década de 70, o gasto médio com esse item era de 2,05%. Em 2003 (data da última pesquisa), ficou em 0,70%”, conta Márcia.

O peso da alimentação também diminuiu no bolso do cidadão médio. Embora seja responsável por 20,75% do gasto atual, em 1975 chegava a 33,91%.

O problema é que alguns custos ficaram ainda maiores. A habitação hoje é o item de maior peso, pulou de 30,41% do orçamento familiar em 1975 para 35,50%. “E para quem paga aluguel, o peso é ainda maior, chega a 14,88% do gasto total de uma família, sem levar em conta os outros itens de habitação”, explica Márcia. O transporte saltou de 11,23% para 18,44% em 30 anos.

Recreação e cultura, assim como educação, têm representatividade maior somente para as famílias de renda mais alta. Isso porque, no caso de educação, as famílias com rendimento inferior a R$ 1 mil utilizam mais a escola pública que as demais. Da mesma forma, atividades de lazer são feitas somente quando gratuitas ou a preços bem baixos.

Fernanda Pressinott