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Reduzir gastos públicos é a única saída

Guarulhos, 08 de abril de 2004

O ex-secretário da Receita Federal e atual consultor tributário Everardo Maciel fez um prognóstico desanimador sobre a trajetória da carga tributária. Em palestra realizada na Associação Comercial de São Paulo para cerca de 100 advogados, o responsável pela política fiscal brasileira entre 1995 e 2002 e por sucessivos recordes de arrecadação disse que sem uma revisão dos gastos públicos, a carga tributária vai manter sua trajetória de alta. “Quem faz carga tributária não é tributo, é despesa”, ressaltou Everardo, durante a palestra “Questões Fiscais Contemporâneas”, promovida pela ACSP e a Câmara Espanhola de Comércio.

O grande problema do Brasil, destacou, é que a discussão dos gastos do governo sempre foi “politicamente incorreta”, dentro e fora dele. “Enquanto na maioria dos países as entidades da sociedade civil olham para o quesito despesa, impera aqui uma preocupação acentuada com os tributos”, emendou, ao cobrar da sociedade uma mobilização neste sentido.

Para justificar sua preocupação com as contas públicas, Maciel citou a evolução da participação dos gastos com benefícios sociais entre 1987 e 2001 – parte do período, Maciel estava à frente da Receita. Em 1987, respondiam por 18,8% do total. Em 2001, 36,5%.

Contribuições – A preferência flagrante e histórica do governo em mexer na base de cálculo das contribuições sociais, como PIS, Cofins e CSLL foi outra questão abordada. Em resposta às críticas que o governo sempre recebeu quanto à maior participação das contribuições no bolo tributário arrecadado, Maciel fez questão de ressaltar que qualquer alteração feita, sempre implicará em menor pressão fiscal sobre o contribuinte. Explica-se. Como estas receitas não são divididas com estados ou municípios, para produzir o efeito desejado na geração de arrecadação, o aumento tende a ser menor, ao contrário do que ocorreria se a opção fosse mexer com o IR ou IPI. Estes impostos, ao contrário, são repassados para os outros entes de federação. “Na verdade, prefere-se mexer nas contribuições para contornar um erro do legislador, que aumentou as transferências do IR e do IPI para estados e municípios”, justificou.

O mesmo equívoco foi cometido no âmbito da reforma tributária, com o aumento do repasse da Cide, o imposto dos combustíveis. “Essa partilha é um prenúncio de aumento de carga tributária”, prevê.

Os advogados presentes ao evento ouviram atentamente à palestra de Everardo Maciel. Na segunda parte, aberta ao debate, os participantes, entretanto, não permaneceram passivos, questionaram vários pontos levantados pelo ex-secretário da Receita. O vice-presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), o advogado Luís Eduardo Schoueri divergiu, por exemplo, da tese defendida por Maciel de que os impostos cumulativos são mais simples de serem apurados do que os não-cumulativos. “As empresas fazem malabarismos para realizar os cálculos, sem falar das restrições ao aproveitamento de créditos”, criticou Shoueri, para quem a maior beneficiária do regime não-cumulativo é a sociedade.

Embora defenda o fim da cumulatividade, o vice-presidente da ACSP abordou algumas distorções criadas com as últimas alterações tributárias, que eliminaram o efeito em cascata e introduziram a tributação do PIS e Cofins sobre os importados, o que geraram demandas judiciais. “Uma das questões é o fato das empresas que usam o regime cumulativo e importam produtos serem oneradas com o PIS e a Cofins, pois não terão direito a crédito”, lembrou.

Outra questão polêmica foi levantada pelo advogado Fernando Aurélio Zilveti Arce Murillo, do escritório Zilveti e Sanden, que defendeu o início de um debate sobre a destinação dos recursos arrecadados com as contribuições sociais. “Sabe-se que, por natureza, essas contribuições prendem-se à justiça social e não fiscal. E o que se constata hoje é um desvio de finalidade, ou seja, a não aplicação correta desses recursos”, criticou.

Já o superintendente do Departamento Jurídico da ACSP, Carlos Celso Orcesi da Costa, embora reconheça a necessidade de se debater o gasto público, ressaltou que o Estado é um péssimo empresário. “Não há dinheiro que chegue para saciar seu apetite”. Para Orcesi é preciso romper com um círculo vicioso histórico e isso implica necessariamente em redução da carga tributária. “Quanto mais dinheiro entrar nos cofres públicos, menos disposição terá para mudar a trajetória de alta de carga fiscal”, concluiu.

Respostas – Sobre a existência de diversos regimes de tributação, Everardo Maciel explicou que toda política tributária ou fiscal está sujeita ao que ele classifica de “regras culturalistas”. O maior equívoco seria generalizar, colocar as empresas numa camisa de força”, disse. Como idealizador do sistema simplificado de pagamentos de impostos e contribuições federais, o chamado Simples, Maciel lembrou que o próprio nome do regime é uma alusão aos anseios dos empresários. “O brasileiro é disciplinado, gosta de praticidade, simplicidade, o que significa custo menor. Portanto, o sistema está em consonância com a sua cultura”. O Simples, revelou, é tão bom que alguns países da Europa já o estão adotando.

Sílvia Pimentel