Notícias

Cinema: em cataz “Chegadas e Partidas”

Guarulhos, 03 de janeiro de 2003

arteA adaptação feita pelo diretor Lasse Hallstrom e o roteirista Robert Nelson Jacobs do belo romance de Annie Proulx, sobre um americano triste e fracassado que se redescobre no Canadá, apenas em alguns poucos momentos capta os tons essenciais de tragédia e comédia absurdas da história original.

Kevin Spacey é o personagem principal, o apático Quoyle, cujos problemas se originaram com seu pai abusivo, Guy (John Dunsworth), que o empurrou na água quando ele tinha 12 anos, quase o afogando.

Um efeito especial notável mostra o rosto de Quoyle, quando menino, debaixo d'água, pouco a pouco se transformando no adulto de 36 anos que hoje trabalha quase como escravo no jornal Poughkeepsie News.

Quoyle vive uma vida passiva até que, um belo dia, a enfeitada e egocêntrica Petal (Cate Blanchett) se separa de um homem e entra em seu carro. Num instante Quoyle está apaixonado, tem uma filha, Bunny, e se vê cuidando da casa enquanto Petal dorme com vários homens, sem nem sequer esconder que o faz.

Blanchett é uma explosão de fogo dramático cuja saída, após menos de dez minutos, gera um vácuo dramático que não é preenchido até o fim do filme. Ela absorve a atenção do espectador a tal ponto que em nenhum momento ele pára para se indagar o que Quoyle está fazendo com ela, ou ela, com ele.

Mas as coisas realmente começam a ir mal quando os pais de Quoyle, doentes terminais, deixam um recado telefônico anunciando seu suicídio conjunto. Em seguida, Petal vai embora com Bunny, mas morre num acidente de carro. Enquanto isso, a tia ianque resmungona de Quoyle, Agnis (Judi Dench), o visita para lhe expressar seus pêsames.

Agnis está a caminho da casa antiga da família, e, sentindo necessidade de mudar de vida, Quoyle e Bunny a acompanham, de navio, até a cidadezinha de Killick-Claw, numa região distante da Terra Nova, no Canadá, onde ainda se ergue solitária a casa que a família Quoyle deixou 50 anos atrás.

Quoyle passa a trabalhar para o semanário local, The Gammy Bird, dirigido pelo editor inseguro e briguento Tert Card (Pete Postlethwaite) e pelo publisher durão, mas justo Jack Buggit (Scott Glenn). A redação da revista é repleta de personagens interessantes.

Um dia, enquanto caminha na rua com seu filho, o deficiente mental Herry (Will McAllister), Wavey Prowse (Julianne Moore) chama a atenção de Quoyle, mas seus dois primeiros encontros com ela são marcados por gafes terríveis.

Enquanto faz uma reportagem para a revista, Quoyle tropeça no Botterjacht, um iate construído para o uso particular de Hitler e que pertence ao casal amargo Bayonet e Silver Melville. Quoyle transforma o incidente numa matéria que impressiona o editor a tal ponto que ele dá uma coluna própria ao jornalista.

Tanta coisa acontece que, quando uma tempestade atinge a cidade e destrói a casa da família Quoyle, é difícil deixar de pensar no conselho jornalístico que Billy dá a Quoyle sobre a importância de identificar o ponto central de cada matéria.

É exatamente esse ponto central que parece faltar a Chegadas e Partidas, e nem mesmo a narrativa final, quando Quoyle afirma achar que “um homem destruído pode se curar”, consegue identificar o ponto central desta história.